No Banho do Vinte Nove, pr'mêro, rapimpamos-se com o decomerzinho qu' a gente leva...
Este ano ninguém teve desculpa p'a nã ir ô Banho do Vinte Nove. Carruaja havia com fartura qu' a Junta e a Cam'bra trataram disso c'm' fazeram ôs ôtros anos. O tempo 'tava do melhor, amoroso qu' até dava gosto, que nem uma arajazinha se sintia. E, méme que muntos digam qu' isto 'tá mau, qu' a coisa 'tá ruim, eles inda vão p' aí pagando as reformazinhas à famila... Que jêto a gente nã s' ir ad'vertir?!...
Foi o qu' ê cá fiz más a minha Maria e uns tantos amigos. E nã dí o tempo p'r mal impregue. Nem ê cá, nem eles. Eles, digo ê cá, que a maior parte era elas. E elas, c'm' mecêas sabem muntíssemo de bem, quái sempre, inda são mái danadas p'à galhofa do qu' ôs homens. E p' ôs que nã querem crer, olhem bem p'ôs retratos qu' ê cá tirí e p' ôs filmes qu' a minha mánica tamém fez que logo vêem s' a r'zão 'tá do mê lado ó se nã 'tá.
D'zer a verdade, já ia p'a uns dôs anos qu' ê cá nã punha lá os pés. Nã que nã gostasse d' ir sempre, mái atão as coisas nem sempre calham a nosso favor... Olhem, o ano passado, nã sê se fui ê cá se foi a minha Maria - ó saria-se os dôs... - 'tava-se com uma catarrêra que nem pensar em sair do monte. De manêras que f'camos p'r 'qui. E há dôs anos, se nã 'tô atribuído, o tempo béque-me 'tava chuvoso que nã deu p'a se fazer nada de jêto.
... muntas das vezes, méme p' à famila da alta, até umas papas mirôilas dã jêto. E sâ gostosas, nã cudem...
Más olhem, desta vez, as coisas correram-me tã bem que nem tampôco tive precisão da via da Câm'bra. Nas béspras, ó p'a melhor d'zer, quái uma semana entes, tive logo aqui a oferta dum amigo que me levava a mim e á minha Maria e mái os mês compadres. Foi o parente Cosme da Quinta.
'Tá bem qu' a via dele - uma camineta de caxa aberta e já um coisinho usada, ora usada, 'tá quái fêta num caneco - nã é lá grande coisa p'a um serviço destes, mái c'm' àquilo era p'a s' ir de nôte, tapados com o encerado qu' ele tem lá, e a Guarda, a essas horas, calhando, eram capazes de 'tar a comer qualquer coisinha e nã andarem aí na estrada a charingar um e ôtro, pegamos na gente e foi-se todos. E inda mái uma pagela deles...
Iam tantos c'm' dez amalhòfados debaxo desse tal encerado. Tirando o chòfer, o compad'e Jôquim do Barranco e a c'mad'e C'stóida, qu' esses, foram na cabine más a minha Maria. Era ê cá, o Adelino da Desmoitada, um gozão do pior, o Arraúl Vàlise, o ti Luís Agúida que tem um mata-velhos mái nã anda de nôte que tem medo, o Martinho do Almarjão, alomeado p'r 'Pata-Rasa', o Tóino Luzicuco, semp'e de cigarro na boca, o parente Zé Caçapo, 'Verruma' l'e chamam, semp'e a sovinar, e fico-me p'r 'qui qu' os ôtros iam todos acuados ô canto do taipal e já nem m' alembra bem quem eles era...
... bebe-se-l'e, tamém, um calcesinho dela. Da boa, 'tá bom de ver...
Nôtres tempos, nã era nada disto. O mái que se podia arrenjar era um carro de besta com uns sês ó sete lugares, nã contando com o carrêro. Quem nã t'vesse carro de besta ó d'nhêro p' ô alugar, qu' era o que se dava com quái todos, ia a pé ó, calhando a terem um burro na arramada, amontavam-se nele, à vez, e passadas umas quatro ó cinco horas, chigavam o sê destino deles, na Praia do Vau.
Mái nã cudem, lá por isso, a galhofa nã f'cava nada atrás do qu' a famila faz hoje em dia... Mái p'ra más do que p'ra menes. Nã vêem, é qu' ir désna de Monchique - levem bem repáiro que d'zer Monchique é o mémo que falar na Serra toda. É o concelho duma ponta à ôtra. - até à Praia do Vau de carro de besta ó a pé inda levava umas belas horas e a famila tinha qu' ir logo adiantando algum serviço.
De manêras que, ia-se andando e c'mendo. Uns p'xinhos da horta, uns coisinhos de chôriça, uma f'lhòzinha, umas coisinhas assim... E p'a impurrar isso p'as goélas abaxo e nã imbassar, o qu' é qu' uma pessoa podia fazer?... 'Tá claro, bebia-l'e uns porrêtes... Ora aquilo dava cá uma influêinça!... Nem o caminho custava a andar...
... charola-se e balha-se um belo pôcachinho p'a desmoer a pelharcada...
Esta conversa fez-me vir à idéa o que se deu desta vez. O Tóino Luzicuco, semp'e com a mania do tabaco, que nã pode passar, 'tava-se a gente todos munto bem sa senhora boa vida amalhòfados debaxo do incerado, puxa da sua onça 'Àguia' dele e do sê livro de papel béque-me da méma marca, tira uma mortalha, despeja-l'e um coisinho de tabaco p'a drento e vá d' inrolar. Pensí cá pra mim:
- Nã me digam qu'este saganheta vai-se pôr a fumar aqui mémo num sito destes...
Inrolô, inrolô... passô-l'e cuspinho com a língua na ponta da mortalha, deslizô-l'e o dedo duma ponta à ôtra p' àquilo colar, deu umas batidinhas com a ponta do cigarro na unha do dedo grande - há quem l'e chame o mata-piolhos... - e pôse-o na boca. Pensí:
- Ehq, aquilo, calhando, é só p'a ele matar o viço e nã no acende, se nã a gente cuda de morrer aqui com falta d' ar e desata tudo a tossir.
Qual o quem?!... Tã penas olho ôtra vez p'ra ele, já o marafado tinha tirado uma caxa de forfes da alsebêra e toca de tirar um forfe p' ô acender. Às escuras, o Tóino nã fechô bem a caxa. Ora, nesse mê tempo, o parente Cosme teve que fazer uma travaja a fundo - só mái tarde é que sube que se l' atravessô um bicho na frente da camineta. O Tóino inda riscô o forfe, sa senhora, e acendeu-o, mái atão, com o balanço, os ôtros des'parceram todos da caxa... Desata tudo numa risada:
... e só despôs é que s' afituramos a ir p'a drento d' água...
- Ai Tóino que lá se foram as tuas acendalhas todas!... E, calhando, o cigarrinho tamém...
- Nã queria mái nada!... O cigarrinho 'tá aqui na boca e este forfe inda 'tá a arder. Dêxa-me lá acender o cigarro entes qu' ele s' apague...
- Olha lá nã sabes que nã é atorizado fumar im sitos fechados?!... Nã vês qu' isto aqui é c'm' se fosse lá na venda do Alferce... Eles lá dêxam-te fumar?...
- Nã vejo aqui nenhum papel na parede a d'zer o contráiro. De manêras que nã seponha com coisas. Más a más qu' o sito é bem arejado...
E pôs-se a ver se dava panhado os forfes que tinham caído. Mái atão, com o vento que antrava p'a drento do encerado com o andar da camineta, adonde é qu' eles já 'tavam... Nem um...
- Bem fêta, qu' é p' à ôtra vez respêtares. E, agora, era bem fêto qu' o vento tamém te levasse o cigarro da boca.
E dí uma piscadela d' olho ô ti Zé Caçapo. Ele, p'r alguma r'zão l'e chamam o 'Verruma', intendeu logo, vai assim p' trás do Tóino Luzicuco, c'm' quem nã quer a coisa, dá-l'e um toque de lado com uma mão, ele volta a cara, ô méme tempo, dá-l'e ôtro toque no cigarro com a ôtra mão, lá vai ele p'ros ares...
Otra risada im forte... Más aí, o Tóino f'cô um coisinho sintido e desatô a d'zer alarvidades. Se nã é o ti Zé Caçapo ser um homem duma certa idade, nã sê nã sê... Inda vi jêtos do Tóino se jogar a ele. Mái a coisa lá atamancô e, dali a um nadinha, 'tava-se a chigar à Praia do Vau.
... ô fim, volta-se p'ra casa, todos sastefêtos, com a trugia toda às costas...
Do que se passô lá méme na arêa da praia já mecêas hã-de saber. Foi tudo munto ad'vertido, a famila incheu tudo o bandulho até mái não, de coisas p'a bober só f'cô lá a água do mar. Quái todos balharam, cantaram e uns tantos que t'veram mái foiteza sempre se jogaram à água p'a se lavajarem e p' à SIC filmar.
Só o que l'es sê d'zer é que inda pus os caguetes tamém drento d' água e, d'zer a verdade, nã na achí munto fria, mái c'm' à minha Maria se tinha desquecido da toalha im casa e as cirôilas qu' ê cá levava eram novas nã me dava jêto molhá-las logo, só cheguí com a água p'ros artelhos. Mái hôve menino que antrô lá p'a drento e quái que já nem queria sair. Ôtros, atão, ensiavam-se qu' ê bem nos ôvia. E, no mêo daquilo tudo, inda béque-me hôve lá um que vinha a arrabolar inrolado numa onda...
Querendem ver videos e retratos do que se passô lá, acalquem aqui na Galeria de Vídeos do Parente da Refóias, na Galeria do Banho do Vinte Nove, e na Galeria do Picasa.
Os videos tamém 'tão logo aí prebaxinho. É só acalcar im cimba deles.
Dés l'e dê saúde.
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