Mái um livro do senhor Carricinho
Sáb'do passado, fui até à Biblioteca. D'zeram-me qu' iam dar p'a lá uma festa, com comes e bebes e tudo, p'a amostrarem um livro com uns contos qu' o senhor Carricinho escreveu e ê cá nã me dí aguentado sem par'cer p'r lá.
D'zer a verdade, isso nã era coisa qu' ê fazesse ô homem. Atã s' ê sô amigo dele, gosto tanto de ler o que qu' ele escreve no Jornal de Monchique... e nã par'cia lá numa ocasião destas?!... Más a más, qu' o tempo 'tava infarruscado que nem o diacho e, a nã ir lá, p' adonde é qu' ê cá ia...
Pôs atão, fiquem sabendo que fui e nã dí o tempo p'r mal empregue. Aquilo foi uma coisa munto emportante, nã cudem. Se vissem o gentío que lá s' ajuntô...
Punhana!... ô lado do homem só 'tavam dôtores...
Olhem, aquilo era Dôtores, era Professores, era os dos partidos - os que 'tã na Câm'bra e os que nã 'tão, mái querem ir p'ra lá - a famila do Jornal de Monchique e da Rádio Fóia, ê sê cá o que más... E despôs, era ê cá e mái uma mêa-dúiza assim c'm' ê cá.
O mê compad'e Jôquim do Barranco nã foi, o marafado... Des que sabe ler pôco e, atã, agora, com a falta de vista que tem, inda menes. Méme com uns óc'les qu' o Zé Manel trôxe lá d' adonde ele trabalha - foi um estrangêro qu' os dêxô lá, uma vez, desquecidos - e l'e deu, já nã se defende.
Qu' ele, d'zer a verdade, podia munto bem ter ido, que nã tinha precisão de ler lá nada. Aquilo era só p'a se os ôvir - e olhe que cada qual falô q'onto pôde... - e, os que t'vessem um coiséco mái de vergonha, comprarem o livro p'a o lerem im casa com mái vagar...
...e um lindessíss'mo ramo de flores...
Mái, dêxando de rir p'a mangar, gostí munto d' ôvir a conversa dos homens. Tôdes falaram munto bem - cada qual à su manêra, 'tá bom de ver - a começar no Sr. Presidente da Câm'bra que, com perdã da palavra, 'tava de munto boa avêa, c'm' quái sempre, e a acabar no Senhor Carricinho que tamém 'tava contente, mái, ô méme tempo, im certa altura nã se livrô de quái se l' arrasarem os olhos d' água.
E nã era caso p'ra menes. Com tanto coisa bonita que d'zeram a respêto do homem - tudo verdade, nã cudem! - quem é que nã f'cava naquele estado?... Olhem, um professor-dôtor que vêo de Faro d'apr'pósito, ch'mado Antóino Mendes se nã 'tô im erro, nã l'es digo nada. Aquilo só com um agravador qu' ê cá nã l'es dô incarecido o qu' aquele homem p'a lá pintô com respêto ô livro do senhor Carricinho e ôtras coisas lá da vida dele.
De manêras que, à uma, 'tava já d'jando de me vir imbora p'a desatar a ler aquilo tudo qu' o senhor Carricinho escreveu, mái, à ôtra, 'tava-me tamém luzindo o olho p'r umas coisas de comer qu' eles puseram lá im cimba duma menza, qu' aquilo tinha aira de ser coisa boa. E ninguém tinha ordem p'a tocar lá inq'onto nã acabassem tôdes de falar. Foi o que se deu.
Q'ondo chigô a vez dele, o senhor Carricinho falô c'm' só ele sabe...
E, ôtra coisa, o senhor Carricinho, despôs do faladoiro, inda se pôs a escrever dedicatóiras nos livros dos que compraram. Más, aí, vêo a mê favor, que f'quí com um livro do mái bonito que possa ser e haver, e bom, e com a letra de quem no escreveu a me mandar um abraço.
Ô certo, ô certo, é que aquilo só acabô já era de nôte e de nôte bem cerrada. Mái vá lá qu' a chuva já tinha abrandado e tamém nã me tinham limpado o mê chapé-de-chuva qu' ê cá dêxí logo à porta da antrada. E, verdade se diga, leví toda a tarde a catarruar só cá p'ra mim s' ele inda lá 'taria à saída...
Mái, voltando ô livro "Memória das Coisas", chego a casa, já nã me dé jêto rapimpar-me com o decomerzinho qu' a minha Maria p'a lá tinha fêto - des que "quem nã come p'r ter comido, nã é doença de p'rigo"... - e joguí-me foi logo a ler aquilo tudo d' infiada. Foi até às tantas...
E, ô fim, p' ôs que qu'seram, inda pôs uma dedicatóira no livro. Ê cá quis logo...
'Tá bem qu' ê cá já tinha lido aquilo tudo, ó quái tudo, no Jornal de Monchique, mái ler, assim , no livro béque-me dá ôtra enfluêinça, o qu' é que mecêas querem... E inda ôtra: o homem fala lá de coisas d' ôtres tempos que, quem conheceu, c'm' ê cá, até fica insampado.
Assim, de chofre, vem-me à idéa o Viva à Rússia, o Zézinho Bartolomeu, o Ti Arraúl, o Jôquim Inês, o Zé Lôrenço e ôtres tantos.... Fala neles tôdes e im munto mái coisas ainda. Comprem o livro "Memória das Coisas" e logo veem se nã morêce bem o d'nhêro que custa. É de ler uma vez e ôtra, fiquem sabendo, e um bom sapatinho, agora p' ô Natal...
Olhem que só foram fêtos mil!... E p'r o caminho qu' a coisa levava no dia da apresentação, im menes de nada se vã acabar. C'm' já se dé na pr'mêra edição. E despôs nã digam qu' ê cá nã nos avisí...
Até qualquer dia e bom Natal p'a mecêas tôdes.
Ah gand Carriçe!!
ResponderEliminarVómcêa tem lá uma prenda no nosso blog à su espera!
Bom Natal!
Vim desejar que o novo ano seja bem melhor do que estes últimos.
ResponderEliminarMas que seja mesmo muito melhor, porque se fôr pouco más ó ménes a mesma coisa deixe lá, não se incomode...
Akele abraço!
ps.: no Natal nem merece a pena falar. Já la vai...
Meu caro, volto à peça com uma questão (que se calhar só é confusa para mim), e que é a seguinte:
ResponderEliminartratando-se do lançamento de um livro, porque é que o autor do mesmo está "desterrado" a um canto da mesa?
Decerto que haverá razões para isso e que a mim escapam. Ou talvez não!
Akele abraço, mê amigue!
Fui ou, ... tenho ido, com este Senhor que, mal vê que pouco ouve, a algumas exposições do MNAA (Museu Arte Antiga) ... a sua sensibilidade permite-me uma outra explicação do visível e puxa-me para outros caminhos estéticos, antes ilógicos, impensáveis ... agora prenhes de conteúdo e de razão! Que bem haja "Avô" Carriço.
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