A r'tunda do Descansa-Pernas, d'zer a verdade, é um coisinho 'pertada...
Um destes dias, hôve um amigo que me falô duma r'tunda que 'tá quái fêta ali p' ô Descansa-Pernas e que des que tem dado p'r 'í um grande falatóiro.
D'zer a verdade, já há bem munto tempo qu' ê cá, q'ondo passava p'r 'lí, via aquele trabalho, mái atã', o qu' é que mecêas querem, nã liguí. Uma pessoa já 'tá tã ac'st'mada a ver covas e impecilh's p'r tôd' ô lado - no mê' da 'strada, nos passêos, adonde calha... - que, parte das vezes, já nã dá importãinça ô que vê...
Mái tamém, agora, abalí e fui lá d' apr'pósito p'a devassar aquilo bem. É que espertô-me inda má's o ent'rêsse qu' ele disse-me p' a ir a um sito ch'mado monchiquenet.com, ô forum deles, qu' é lá adonde conversam e chamam nomes uns ôs ôtr's, qu' até já tinha sido lá alomeado o mê nome.
E nã é qu' ele tinha r'zão?!... Olhem, 'té f'quí tod' inchado de incontrar lá um a d'zer qu' era admirador cá do Parente... e mái contente f'quí ainda p'r mode ter descobrido qu' a famila já vai escrevendo umas coisalhas na internet.
E tamém me fartí de rir qu' aquilo, alguns, sã marafados p'a largar uns d'chotes - com r'zão ó sem r'zão - que sã munto bem caçados. Em tendem um coisinho de vagar, vã' lá e andem um pôcachinho à pregunta daqueles mái ad'v'rtidos que, calhando, panham uma barrigada de rir.
Mái, voltando ô Descansa-Pernas, 'té fui lá mái depressa qu' ê tamém já tinha tirado uns retratos ô campo da bola e perdi-os. E pensí:
- Duma assentada faço as dôs serviços e, assim, em me dando jêto, já tenho assunto p'a m' entreter mái um pôco.
Os carros l'gêros amanham-se bem. Mái atã' e os ôtr's?...
E foi o que fiz, já a mê' da manhã, com um belo sol que nem parêce deste tempo a dar luz e calor à força toda. É que nã se desqueçam qu' inda 'tamos em F'v'rêro e aquele pôcachinho qu' ê 'tive lá, que nem um casquêro leví nos cascos, já sinti ele m' acalar bem na cachimóina.
E olhem qu' os antigos d'ziam qu' ele, nestas alturas do ano, sabe bem mái paga mal e é bem verdade. Nã se pode uma pessoa descudar ó é d'adregue nã panhar p' aí uma catarrêra que nã é coisa nada boa de gramar. E com essa gripe que dá p' aí nos pintos, nã há c'm' um homem s' aprecatar...
Pôs, fiz o caminho todo até lá e nã dí arrenjado um amigo p'a ir com-migo, p'r más que nã fosse p'a se tramelar um coisinho. Isto a famila, com este tempo, vai logo tudo fazer alguma coisinha na fazenda. Os que já têm umas batatinhas temprôas com o tempo fêto apr'vêtam p' às arrencar. Ôtr's têm a cava p'r fazer e lá vão, d' inxada ô ombro ó amontados num trectorzalho, fazer esse serviço.
De manêras que, ô chigar lá, fiz-me assim, béque-me, desintendido, p'a ninguém repàirar no qu' ê 'tava fazendo e lá fui tirando retratos até mái não. Só passado um belo pôco é que vejo assomar lá à curva do hospital um vulto. Digo:
- Aquilo há-de ser alguém conhecido, calhando...
E abalí d'rêto a ele, que, nesse mê' tempo, já tinha descobrido qu' era um home e dava-me ares a ser o ti Vergil Patinha, qu' ele trazia um burro d' arreata, tal e qual o Carôcho dele, com uma listra branca na testa, o andar lazêrento e as orelhas semp'e munto pendidas p' ôs lados.
Atã e nã é qu' era méme?!... E conhecé-me logo. Inq'onto ia ô incontro dele, já o ôvia arrulhar:
Vindo do lado de Sabóia, carros grandes, assim c'm' um semi-reboque, é uns trabalhos...
- Eh, amigo Refóias, há tant' ô tempo que nã no via...
- Eh, ti Vergil... Atã c'm' é que vai?... Já vê' hoje da R'bêra Grande?...
- Vinhe. Tenho aqui o mê Carôcho descalço duma mão, que l'e caí' a ferradura, o pobrezinho até quái que coxêa, leví aí uma preçanada de tempo p'r esse caminho.
- Ó mê belo amigo, tem que ferrar o bicho qu' ele nã pode andar assim...
- Pôs tenho e vô-me já tratar disso.
- Vá, sa senhora. Mái nã vá munto depressa qu' eles, agora, fazeram além uma r'tunda tã pertada - nã na vê além? - que pode o Carôcho nã dar fêto a curva e jogar a carga p' a fora da estrada...
- Lá 'tá vomecêa semp'e a mangar...
- É verdade, ti Vergil. Fazeram ali um trabalho que toda a gente põe as mãs na cabeça c'm' é um carro grande, que vá daqui, dá passado sem bater no lancil ó pisar a r'tunda com o rodado de trás.
E lá se foi os dôs andando p' ô lado do Descansa-Pernas.
- Nã vê?...
- É capaz de ter r'zão, sa senhora. 'Tá bem qu' ê nunca tirí carta, mái béque-me vejo isso ruim p'a qualquer dar dado aí a volta com um camião dos grandes. Tem que ser fôito e ter munta práct'ca de guiar.
- Mecêa nunca tirô carta, mái anda aí na estrada munta vez com o sê Carôcho e vê as coisas c'm' elas são.
- Más olhe qu' eles fazeram aqui uma coisa qu' e 'tá munto bem fêta... Nã vê, a calçada além da r'tunda 'tá à méma altura do alcatrão. Há-de ser p' ôs camiõs l'e passarem com as rodas p'r cimba e nã haver azar...
- Calhando, 'tá a ver bem a coisa... Os homens sabem o que fazem...Má's, eles tã inda ali a escrafunchar no alcatrão. Andam, andam, inda vã desmanchar aquilo tudo... E aquele nã é o amigo Carlos?...
- Qual? Um que mora àlém daquela banda? Pôs é...
Inda pensí qu' o home ia partir aquilo tudo p'a pôr c'm' d' antes, mái 'tava atribuído...
O homem 'tava lá no sê serviço, com o m'tor nas mãs, jogado ô alcatrão a fazer aquilo tudo im fanicos, com o barulho nã intendia nada da nossa conversa. Tive que l'e dar vaia, bem alto, p'a ele olhar p' à gente.
- Atã, mê amigo, vã' estafajar isso tudo ôtra vez? Era o qu' eles faziam bem...
- Nã!... Ist' é só p'a descobrir aqui as tampas. F'caram baxas. Esta e mái umas duas ó três. Nã vê àlém aqueles buraquinhos pequenos? P'r baxo 'tã iguás a esta.
- Ah, e ê cá a pensar qu' inda 'tariam p' aí a alargar isto mái um coisinho ó...
- Nã, nã... Ist' é só p'a eles darem subido estas tampas p'ra cimba.
- Atã, nã perca o sê trabalho qu'ê vô-me andando aqui com o ti Vergil, qu' o burro dele já 'tá empert'nente de 'tar aqui parado a olhar p'ra isto.
- Lá isso, ele só o que faz é abanar as orelhas... Dêxa-me lá ver s' ele tem p' aqui algum atabão a l'e picar?
Diz o ti Vergil, inq'onto dá uma vista d' olhos às orelhas do bicho.
- Hum... Cá p'ra mim, ele 'tá-l'e é a par'cer mal do que 'tá ver...
- Atabão nã vejo nenhum, lá isso nã vejo...
- Bom, haja saúde... Vamos más é assomar ali ô qu' eles 'tã a fazer p' à fêra dos inchidos...
E lá 'tavam já os barracõs tôd's no ar, prontos p' à festa de Sáb'do e D'mingo.
Por isso, já sabem. Sáb'do e D'mingo nã se furtem a vir comprar umas chôricinhas, morcelas, mólhes, torresmos e tudo que qu'rerem do que se faz numa mortepórque.
E no que respêta à r'tunda do Descansa-Pernas, aquilo inda nã 'tá bem acabado e pode-se dar o caso de se 'tar a falar entes de tempo. De manêras que, logo se vê no qu' é qu' aquilo vai dar. E vai com calma Chico... c'm' d'zia o ôtro.
Passem munto bem.