27 março 2008

A Procissão Real

Procissão Real de Domingo de Páscoa - Monchique
Tã penas lombriguí este estandarte, vi logo qu' a Pr'cissão Real 'tava a sair...

- Vá lá qu' ele, este ano, andô a meter medo à famila, mái, ô fim de contas, com respêto a chuva, nã fez a parte à gente...

- Já chigô, o ano passado, que nã dêxô a Pr'cissão Real sair. Méme à hora da missa, caí' cá uma ripada d' água que foi uma brut'lidade...

Isto era a conversa da minha prima Mari' Olinda p' ô homem dela, o parente Tóino Choça, os dôs quái incostados à ombrêra da porta da ingreja, despôs da missa acabada, à espera qu' a pr'cissão saísse.

O parente Tóino, já béque-me assim um coisinho infèzado com tanto incontrão qu' os que 'tavam a sair l'e davam, inda fez um jêto de quem se queria ir imbora dali, más ela jogô-l'e, logo, a mão à manga da blusa e nem p'r nada o dêxô abalar.

- Nã te vás imbora, Antóino... Nã vês qu', e despôs, é d' adregue se dar panhado um lugarinho bom, logo ali ô pé do andor?...

- Qual andor, qual o quem!... Atã já te desqueceste qu' a Pr'cissão Real nã leva andores?... Vai é o senhor Prior com o Santíss'mo debaxo do pálio...

- Ai, é verdade!... Nã faças caso... 'Tava atribuída com a pr'cissão de Sant' Antóino lá im Marmelete qu' a gente, inda o ano passado, se foi logo ali ô pé do andor do santinho... Até ê cá l' aprometi uma promessa s' ele arrenjasse p' aí um mecinho jêtoso p' à nossa Zabelinha...

- Lá 'tás tu semp'e com essas coisas... Dêxa a moça qu' ela, se t'ver de casar, logo se casa... É preciso 'tares-te semp'e metendo?...

Ê cá 'tava logo ali ô pé, ôvindo a conversa toda e, c'mo eles nã davam p'r mim, ch'mí:

Procissão Real de Domingo de Páscoa - Monchique
Na Pr'cissão Real nã há andores. Vai é o Santíssimo debaxo do pálio...

- Eh, parente Tóino. Parente Tóino!...

Ele nã ôviu.

- Prima Olinda... Oh prima Olinda!...

E nada...

'Tavam tã emprensados na conversa qu' uma pessoa falar p'ra eles ó conversar com a parede era tal e qual a méma coisa.

De manêras que, lá m' aprocheguí mái um coisinho e pus-me mémo na frente do parente Tóino, quái entremê dos dôs. Aí, o homem esbugalhô os olhos d'rêto a mim e ia-me já dar um impurrão dali p'a fora, mái foi à medida de me conhecer.

- Eh, parente Refóias... Quái que nã no conhecia, até f'quí assim mê coiso... Atã que tal vai isso?

- Nã l'e parêça mal, parente... Já l'es tinha dado vaia umas duas ó três vezes e mecêas nã ôviam...

- Pôs... 'Tava-se aqui a falar nas nossas coisas... Ê cá a d'zer ô mê Antóino qu' o vivêro das batatas-doces, este ano, 'tá um coisinho atrasado... calhando, inda ele há-de ter más é que comprar uma manchinha de podas p' aí no mercado...

Cudando ela qu' ê cá nã tinha ôvisto a conversa de qu'rerem casar a moça...

- Eh'q... Mái isso, tamém, inda nã é tarde, prima... E o tempo vai frio que nem um cadelo, o qu' é que l' adianta ir despôr podas de batata-doce já?!... Ê, às vezes, só as desponho lá p'a S. João... Aquilo é uma sementêra que gosta é de tempo quente...

- Isso, lá p' ô mê sito, é munto tarde... E nã se esqueça qu' ele é d' adregue nã vir chuva logo a seguir ô vinte nove e elas, em alagando, ficam àguadas que nã prestam p'ra nada...

- Dá-se-as ô pórco... Olhe qu' um porquinho ingordado a milho e batata-doce dá uma carne do melhor!...

Nisto, a Pr'cissão Real a sair...

Procissão Real de Domingo de Páscoa - Monchique
Até vêo a banda de Vila Nova e tudo...

- Olha, Mari' Olinda, vai tu aí na pr'cissão qu' ê cá vô-me aqui com o parente Refóias qu' ê já vi qu' ele tem aqui a mánica p'a tirar retratos e ê gosto de ver isto.

- Que bem que me calha... Olhe, parenta, ajunte-se àlém com a minha Maria - nã na vê àlém daquele lado? - e metam-se as duas aí na ala da pr'cissão qu' a gente, ô fim, logo se há-de incontrar ôtra vez, aí im qualquer banda.

- Vocês hã-de arrenjar sempre manêra de se furtarem a ir aqui ô pé da gente... Agora vejam lá é s' isso é conversa p'a se meterem aí nalguma venda e dêxarem a pr'cissão da mão...

- Qual o quem!... Lá premode isso, pode ir descansada, prima...

E abalô d'rêto à minha Maria, que já 'tava a fazer um lugarinho p'a ela antrar ali p' ô pé dela.

O mesmo fez a gente, mái p' ô ôtro lado, d' adonde vinha a banda de Vila Nova tocando uma moda do mái bonita que podia ser.

- Nã vê, parente, que bela banda que lá os de Vila Nova têm? Apresentam-se aí tã bem infarpelados que parêcem uma orquesta qu' eles amostraram na minha tel'visão, no Dia d' Ano Bom...

- Atã nã é uma pàxão a gente aqui im Monchique já nã se ter uma banda nem nada?...

- Ora se é!...

Procissão Real de Domingo de Páscoa - Monchique
Mal me descuidí, já fui panhar a pr'cissão quái ô canto de cima do Porto Fundo...

- Olhe qu' ele chigaram a haver uma aqui, ôtra im Marmelete e ôtra no Alferce... E, agora, nada...

- Se nã 'tô atribuido, o mê pai - que Dés o tenha - uma vez, contô-me que só aqui na Vila chigaram a haver foi duas...

- Isso nã sê. Mái, inda nã há muntos anos, uma, p'r menes, havia. Olhe, o mest'e Vintura, ali das tel'fonias, tocava nela. Ele há-de saber bem disso.

- Dêxe 'tar que, em 'tando com ele, vô-l'e falar no caso...

- Dêxe lá o homem sossegado qu' isto é só uma conversa aqui p' à gente... Agora se quer fazer alguma coisa, posso-l'e dar uma idéa...

- S' ela ser boa...

- Olhe, pr' ô ano vai-se ôtra vez votar p' à Câmbra, nã se vai?

- Calhando... Nã sê bem, más eles já nã há-dem demorar munto a virem p' aí fazer barulho ôtra vez...

- Pôs atão, tôdes os que par'cerem ô pé da gente a pedir votos, a gente diz que vota neles s' eles serem homens p'a fazerem ôtra banda cá im Monchique. O qu' é que l'e parêce?...

- Ora o qu' é que me parêce?... Ê cá, influído c'm' sô p'r coisas dessas, sendo preciso, até dava uma ajuda, méme pequena, veja lá... Más há aí uma coisa que me descorré agora...

- O qu' é que sará...

- É qu' esses aí dos partidos, s' a gente l'e pedir isso, aprometem logo que sim...

- Atão... É o qu' a gente quer...

- Mái, despôs, quem é que l'e diz qu' eles fazem?... Nã sabe o qu' é qu' a casa gasta?...

- Lá isso... Mintirôsos c'm' alguns são...

- Alguns?!... Ai alguns...

- Eh'q, ele semp'e há-de haver p'r 'í um ó ôtro que nã seja munto... Mái nã l'e parêce qu' era uma coisa boa ter-se aqui uma banda? É que nã era só por a ter, era p' à malta nova - e quem diz nova diz velha... - ir aprender música e tocar...

Procissão Real de Domingo de Páscoa - Monchique
Im menes dum farol, deram a volta à Vila e já vinham a chigar ô Alto da Praça...

- Pôs era... Olhe, até a minha Zabelinha ê punha lá. Nã m' emportava de pagar fosse o que fosse p'a aprender a tocar fole...

- Fole?!... Na banda nã tocam fole, parente... Mái podia aprender ôtra coisa qualquer. Calhando, além aquela coisa preta que parêce um pífaro, nã vê?

Diz logo um f'lano, todo munto empinocado, com voz d' alvorêro, que 'tava ali p' trás da gente e, p'r o jêto à escuta da nossa conversa:

- Um clarinete. Aquil' é um clarinete, mam...

Logo, pusemos-se assim a olhar de esguelha p' ô homem. Más ele nã s' emportô e desatô a falar inda má's:

- Aquilo é um clarinete e sabem que jêto ê saber isso? É que tenho uma prima que tem um filha que toca aqui nesta banda, mái hoje nã 'tá cá, e é clarinete qu' ela toca. E tamém há lá mái umas mecinhas, filhas de gente daqui, que tocam esse instrumento. Nã se maráfem d' ê me meter na conversa, monch'quêros dum raio... Olhem qu' o mê avó tamém era daqui, mái vendé tudo o que tinha ali p' ôs lados da Fóia e comprô um pedacinho de terra lá no Vale das Hortas...

Bom, o homem, s' ê nã no atalho, inda agora lá 'tava a falar. Aquilo par'cia uma grafenola com o disco riscado...

- Ó mê belo amigo, e o qu' é qu' a gente tem a ver com isso?... Inda se mecêa pagasse uma coisinha qualquer p' à gente bober ali no Café de Cima...

- Oh dieb's, venham já daí... Eles nã terão lá vinho do Cramujêra, qu' a gente bebe-l'e um copo daqueles grandes cada um?...

- Isso, aqui, já nã se usa a bober vinho assim... S' o mê belo amigo tem vontade de pagar e quer exp'rimentar o qu' é bom, bebe-se más é um porrete de madronho cada um. O vinho é p'a se bober com o decomerzinho...

- Atã, vá. Vocêas é que sabem. Aqui na Serra mandam os parentes...

E lá se foi os três. Más o qu' ê l'es sê d'zer é que, p'a ir tirar mái uns retratos à pr'cissão, tive qu' os dêxar lá no café a palear sòzinhos os dôs. E só já a fui panhar quái ô canto de cima do Porto Fundo.

E, dôtra vez que calhe, logo l'es conto c'm' àquilo foi o resto da tarde com o alvorêro a beber copos e, cada vez, a d'zer mái patacoadas.

Passem tôdes munto bem.

18 março 2008

O Parente da Refóias na 'Exame Informática'

O Parente da Refóias na Exame Informática
Com respêto a comp'tadores, a Exame Informática é uma revista c'm' nã há ôtra im Portugal...

Um dias destes, meteram-se-me p' ali uns bichos no comp'tador que, désna da semana passada, tenho andado impeçado com ele. Más ô bem fêto, nã cudem...

Aquilo, em aqueles virus par'cendem, um homem - mòrmente assim c'm' ê cá - nã dá conta daquilo nem de manêra nenhuma. É qu' os marafados escarrapacham-se ali drento, levam p' ali a fazer nã sê o quem, q'ondo mal uma pessoa dá por isso, já o comp'tador nã fonciona nem à pàzada...

Aquilo - mal comparado, 'tá bom de ver - quái que me faz alembrar aquele bicho-crapintêro que dá nos p'nhêros q'ondo eles secam. E nôtras arves tamém. Leva a rilar, a rilar... noite e dia, que nunca apara. É im menes de nada qu' o pau fica todo carunchoso...

E quem ôlha assim p'r fora, mòrmente s' o pau inda t'ver casca, a maior parte das vezes, nã dá notiça de nada. Mái, s' olhar bem lá p' drento, vê logo o lindo trabalho qu' eles 'tã a fazer.

Mái, isto tudo só p'a l'es d'zer que, premode o qu' a revista Exame Informática me fez, ê cá nã podia dêxar passar sem escrever este post, logo neste mimento. E, aí, tive que me valer do comp'tador da minha Maria...

É qu' ela, agora, meté-se-l'e na cabeça que tamém havera d' ir à internet... E, atão, desatô a usar um comp'tador mái velho que sê cá o quem, qu' ela desencantô tamém nã sê adonde. E anda tã influída com isto que já leva aqui o tempo quái todo... Até o decomerzinho ela, às vezes, já se desquece de fazer...

Apagarbe-Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho - Largo do Pé da Cruz - Monchique
Neste caderno, eles usam a pôr aqui meia-dúiza de sites, tôdes meses...

Más a parte da Exame Informática é que enteressa. Atã nã é qu' os marafados usam a pôr mêa-dúiza de sites lá naquele caderno ch'mado "Exame Informática - Soluções" que mandam drento da revista e, este mês, alembraram-se cá do Parente?!...

Ah, fado dum ladrão!... Tã penas vi tal coisa, f'qui mái contente que nem uma pega sem rabo... Abalí caminho da minha Maria, até l'e dí logo um abraço e tudo. D'zer a verdade, a m'lher até f'cô assim mê insampada, qu' ela nã 'tá lá munto ac'st'mada a isso, e béque-me estranhô...

Mái, q'ondo l' amostrí aquilo, fez assim um rizinho e disse:

- Ehq'... Isso nã sará eles p'a antrarem contigo?...

- Pode ser que seja... Mái atão eles nã me conhêcem... Dêxa lá isso da mão. Que seja p'a mangarem que nã seja, fico sast'fêto na méma.

- Vê lá isso nã traga pr' aí alguma coisa ruim... Nã vã os da Caxa cudar que tu já sejas munto conhecido e que se tenha algum d'nhêralho no Banco e cortem p' aí a reformazinha à gente... Ai, vê lá isso bem!...

Neste mê tempo, vinha o mê compadre apontando à nossa rua, vi' a minha Maria com aquele ar de remôrso, quis logo saber o que era:

- Nã se 'tá sintindo bem, c'mad'e Maria?

- 'Tô, sa senhora, mái o sê compadre amostrô-me aqui uma coisa qu' ê f'quí quái com medo...

O Parente da Refóias na Exame Informática
E nã é que, este mês, s' alembraram cá do Parente?!...

- Nã ligue, compad'e Jôquim. Isto, as m'lheres escagáiçam-se com tudo... Atã nã vê qu' eles, aqui nesta revista, falaram desta coisa do mê site qu' ê faço aqui na internet e ela já 'tá com medo de l'e cortarem na reforma...

- Olhe lá... E, calhando, nã 'tá lá munto fora de jêto, nã senhora... Ficam tôdes a saber que mecêas até têm comp'tadores e tudo... Nã sabe c'mo eles são?...

- Que jêto?!...

- Ê cá, se fosse a si, dêxava-me dessas coisas. Mecêa já nã tem idade p'ra isso e nem jêto... Um dia destes, inda se dá é mal...

- Dêxe dar... Mái vale um gosto que cem mem rés na als'bêra...

E agora, vô-me ali p' ô mê comp'tador a ver se dô posto aquilo a foncionar c'm' deve de ser, qu' a minha Maria já me tanchô aqui uma catovelada nas costas p'a ê cá me pôr a andar daqui p'ra fora.

Querendem ver adonde eles falam no Parente da Refóias, comprem a revista Exame Informática numbre 154 de Abril de 2008 e vã à página 29 do Caderno.

E fiquem-se com Dés, até qualquer dia.

12 março 2008

A Apagarbe

Apagarbe-Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho - Largo do Pé da Cruz - Monchique
A famila que estila madronho andam danados p'a fazer um ingarrafamento a precêto...

Daquela vez qu' ê fui à Fêra dos Inchidos, - inda ele nã há quinze dias... pôs nã há... - a barreca da Apagarve foi das qu' ê cá mái leví repáiro. Nã é p'r nada, mái aquilo em se tratando d' aguardentinha de madronho é uma coisa que me fica logo nos olhos.

E, atão, o qu' é qu' ê f'quí a saber... Qu' ele andam pr' aí uns q'ontos que já deram o nome p' à Apagarbe e 'tão tã influídos im fazer uma casa p'a ingarrafar o madronho qu' até já mandaram fazer um desenho da casa e tudo, a um arquitecto - que tamém é cá de Monchique.

E olhem que nã é uma coisa que diga só respêto ô madronho. Tamém fazem tenção d' ingarrafar lá uns boianitos de mel e fazer umas garrafinhas de licor. 'Tá bom de ver - dig' ê cá... - qu' o licor há-de ser dessas bagas e ervas que s' apanham aí p'r esses cerros fora, c'm' ôs martunhos, as amoras das balsas, o poêjo e ôtres tantes.

Mái, p'r jêto, a Apagarbe serve p'a munto mái coisas. Foi o qu' o ti Manel do Fojo me disse, ontordia. E s' ele me disse é qu' ele lá sabe. O homem tem aquela grande enfluêinça im fazer madronho, nã há nada qu' ele nã descubra...

E, d'zer a verdade, o homem é tã mê amigo qu' até já me dé uma garrafinha da qu' ele fez este ano e disse-me logo:

Apagarbe-Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho - Largo do Pé da Cruz - Monchique
Ele há uns q'ontos que já têm umas garrafinhas que sã uma coisa chigado ô qu' é bom...

- Amigo Refóias, leve essa e beba-l'e à sua vontade ó faça dela o que qu'rer, que, em ela s' acabando, passe p'r cá que, s' ê inda t'ver, logo l' arrenjo ôtra...

- Oh, ti Manel, tenha lá p' aí tento... Isto é uma coisa que dá uma mort'ficação marafada p'a fazer e mecêa tamém nã pode 'tar p' aí a dá-la toda sem mái nem menes... Agora se me despensar p' aí um litrinho ó dôs dela, vendida, aí sim...

- Que jêto?!... P'ra si, é dada, nã venha cá com coisas...

- E, atão, que vomecêa só sabe é fazer da boa... Nã vê qu' isso rendia-l'e aí um bom d'nhêro. Des que já há quem na venda aí a trinta eros... E trinta e cinco...

- E há quem compre?!... 'Tá bem qu' ô trabalho qu' ela dá, nã é demás, mái p'a quem compra é um coisinho puxado... Olhe, ê nã vendo nenhuma este ano, qu' a que fiz é só p' ô gasto, mái nunca vendi a mái de vinte eros o litro. Aquilo era conta certa... um garrafanito, cem eros.

- Mái, dessa manêra, inda pensa im fazer p'a vender...

- Pôs... S' aquilo da Apagarbe ir p' à frente, calhando, inda sô homem p'a fabricar uma gotinha p'a levar p'a lá...

- E adonde é que vai estilá-la?

- Ali na minha caldêra...

- Des qu' eles 'tã p' aí tã enxigentes com isso...

- Pôs 'tão, mái a famila lá Cam'bra e da Apagarbe ensinam à gente c'm' é que s' há-de fazer e, calhando, tamém a'x'lêam no que ser preciso e eles possam. Já ê cá falí lá com um daqueles que mandam naquilo - um que trabalha na Caxa, nã m' alembra, agora, o nome - e ele dé-me boa palavra.

Apagarbe-Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho - Largo do Pé da Cruz - Monchique
Na Fêra dos Inchidos, levaram p'ra lá tudo o que tinham de mái bonito p' à famila ver...

- Faz mecêa se nã bem. Gasta ali mêa-dúiza d' eros, mái fica com uma coisa legal, c'm' deve de ser...

- Mêa-dúiza?!... Diz mecêa... Aquilo vai-me más é p'a uns centos de contos... Atã nã vê que tem que levar chão, paredes pintadas, umas redes premode os mosquitos... e retrete!... veja lá... Agora já nã se pode fazer o serviço p'r trás dum madronhêro...

- Atã, sacuaso, um homem andar a panhar madronho lá na altura dum cerro da Refóias, ó méme a mêa chapada, e l'e dar vontade, tem de vir à retrete na adega?!...

- Isso nã sê... Mái que tem que ter lá a retrete, tem. Use-a ó nã a use...

- Se nã fosse 'tar tã velho, inda me metia, tamém, numa coisa dessas... Ê cá e os mês ermãs temos p'a lá aquilo c'm' o mê pai - que Dés tenha - dêxô. Ajêtava-se a adegazinha, qu' inda 'tá d' em pé, alimpava-se os madronhêros e inda se fazia lá umas caldeiradas uns anos p'r os ôtros...

- Atã, e nã fazem premode quem? Aprevêtem agora que, despôs, calhando, será d' adregue isso nã ter mái que se l'e diga... Qu' eles, no prencip'o, fac'litam semp'e, mái, despôs, sabe-se lá o que sará...

. É capái de ter r'zão... Inda hê-de falar nisso ôs mês ermãs...

- Fale, sa senhora. Olhe que, p'r o qu' eles me d'zeram lá, aquilo nã se vai dar o tempo p'r mal impregue.

- Atão?

Apagarbe-Associação dos Produtores de Aguardente de Medronho - Largo do Pé da Cruz - Monchique
Quem qu'rer, dê o nome p' à Apagarbe que fica logo sóiço...

- Atão, des qu' até vã arrenjar uma marca p' à aguardente toda dos que darem o nome e põem-na numas garrafas assim todas p' ô fino. Ora, os estrangêros e o pessoal de fora nã s' emportam de dar uma preçanada de d'nhêro méme aquilo nã levando bem o litro.

- E algum que parêça lá com uma pinga assim más enferior?

- Isso, há-de arreceber menes e é aprevêtada p'a licor. Se ser... Qu' a ingarrafada, essa tem que ser toda da boa!... Nã há lá masturas... Eles até des que passam um diploma im c'mo ela é ali pura c'm' saíu da caldêra e agraduada c'm' pertence...

- Tó, raio!... Já 'tô a ver qu' isso 'tá-se a preparar tudo p'a f'car com um derrijo c'm' deve de ser...

- Atã, se nã fosse assim, ê cá tamém nã opunha a dar o nome e fazer o que faço tenção de fazer...

- Calha bem, ti Manel. Vô-me falar com o mê compadre Jôquim do Barranco qu' ele, calhando, tamém nã há-de ir munto fora disso e vamos tratar os dôs do caso.

- Nã s' alembra, um ano qu' ele estilô e teve qu' andar p' aí a fazer umas caldêradas só às nôtes p'a nã ser panhado? Daqui im diante, nã tem precisão nenhuma disso. Tem é que se legalizar e dar o nome lá na Apagarbe p'a eles, despôs, fazerem aquilo render...

- Atã nã m' alembro?!... Inda ê tenho p' ali uns retratos disso... Logo os amostro, um dia destes. E, com tanto madronho que vai par'cer, c'm' é qu' eles o dã vendido todo?

- Cale-se aí! Até reclame eles vã fazer da nossa marca d' aguardente...

Aqui, calí-me. Qu' ê cá, dessas coisas, nã intendo nada. Logo se vê o qu' é qu' a fruta vai render... Mái qu' aquilo é famila capaz, isso é. E, adonde se metem, usam a dar conta do recado.

Querendem deslindar isto melhor, vã a estes sitos qu' eles sabem munto melhor disto do qu' ê cá:

Câmara Municipal de Monchique e Correio da Manhã.

E até qu' a gente se veja.

04 março 2008

A Feira dos Enchidos 2008

XV Feira dos Enchidos Tradicionais de Monchique - 2008
Já faz 15 anos qu' esta fêra c'm'çô. Punhana!... Parêce qu' inda foi ontem...

Da pr'mêra vez que fazeram esta fêra, foi uma coisa assim, béque-me, quái a medo, mái par'cé logo tanta famila - uma coisa méme de rompante... - que hôve menino que perdé a tarde toda aparado ali na estrada de Portimão e quái que nã dava cá chigado.

P'r menes, as amigas da minha Maria que moram lá p'ra baxo p' ô pé de Vila Nova, contaram isso à gente. E inda más... Des qu' aquilo era uma chusma de carros e de famila que p'a cá chigarem foi um castigo e, despôs, os que vieram mái tarde nã panharam nada d' inchidos p'a comprar qu' eles já tinham marchado todos...

Tã penas elas contaram isso, disse logo à minha Maria:

- Maria, ôviste bem o qu' elas d'zeram. D' hoje p' à frente, nã vã eles fazer a parte à gente e comprar tudo ôtra vez, vai-se logo lá assim qu' aquilo abrir. No pr'mêro dia... E, da parte da tarde, aí das três im diante, logo se vai, atão, p'a bispar tudo bem, ver a famila de fora e algum tocador de fole ó fadista que p'a lá 'tejam.

 XV Feira dos Enchidos Tradicionais de Monchique - 2008
D'zer a verdade, com estes óculos de pó, quem é que nã cuda qu' o homem é cego...

Ela béque-me fraziu os sobrôlhos um belo coisinho, mái dé-se p'r o mê conselho e inda nã 'tá repesa. Até ô dia d' hoje, nunca se f'cô a juar. Vai-se bem cedinho, q'ondo aquilo inda 'tá im sossego, escolhe-se o que se quer, cá à nossa manêra, sem marafundas e vai-se logo pôr tudo im casa. É um descanso...

Foi o que fazemos Sáb'do passado. E atão que 'tava lá um a cantar qu' aquilo era d' a gente s' arrabolar a rir. Ai homem marafado!... Aquilo era com cada bojarda... Dichote p'a um lado, chalaça p'a ôtro e as puas qu' ele metia no entremêo?!...

Era um Raxinol Faduncho qu' eles falam pr' aí, qu' ê cá q'ondo vi o nome anunciado, d'zer a verdade, nem dava nada p'r aquilo, mái, visto ô vivo, o estapôr é munto bem caçado...

Logo, que 'tá vestido duma tal manêra qu' uma pessoa olha p'ra ele, dá-l'e, logo, graça. E, despôs, com aquele jêto dele e os miécos que faz à acompanhar as chalaças, quem é que se aguenta sem incher uma barrigada de rir...

E ê cá, atã, a certa altura inda me ri mái do qu' ôs ôtres. Logo assim qu' antrí, ô pé duma barrequinha daquelas que vendiam aguardente, dô com o Tóino Luzicuco que já havera de 'tar a imborcar neles désna de mái cedo e, nã é que nã se desse lembido, mái que já 'tava antradote, 'tava.

 XV Feira dos Enchidos Tradicionais de Monchique - 2008
Aquilo era uma chusma de gente naquela Fêra dos Inchidos...

De manêras que, inda paguí p' ali uma rodadinha ó duas e ele tamém, e f'cô-se a ver o Raxinol Faduncho ô pé um do ôtro, no mê daquela matula toda que quái um homem nã se dava mexido. A minha Maria, essa já tinha ido lá bem p' à frente, com as amigas dela, qu' era p'a verem o cantorío bem d' ô pé.

Ora, o Tóino, com aquela pòzêra toda qu' eles fazem lá no palco - nã sê s' é pó, s' é fumo, s' é o quem... - e com os porretes que já tinha baldeado, nã dava visto quái nada do que se passava lá p' à frente. Mái, a certo passo, lá l'e par'ceu qu' o fadista tinha uns óculos de pó. E era verdade. Diz logo, de chofre:

- Mái atão, o pobrezinho é cego!... Nã vês, Refóias, usa óculos de pó p' a nã se l'e ver olhos!... Olha o pobre do homem...

- Que jêto?!... Ê cá nunca ôvi falar...

Aqui, mete-se o parente Zé Caçapo na conversa, que 'tava ali, quái arrumado à gente, logo da bandinha de lá, e inda nã se o tinha visto:

- É cego, sim, é!... É cego dum olho...

- Ê nã te disse, Refóias, qu' ele havera de ser cego... Se nã fosse, p'a qu' é qu' ele usava aqueles ólicos, com as lentes pretas daquela manêra, drento de casa?... 'Tava-se méme a ver...

. ?!...

 XV Feira dos Enchidos Tradicionais de Monchique - 2008
A Rádio Fóia e o Jornal de Monchique nã faltaram. E que belos amigos que lá tinham...

- Sim, Tóino, tens toda a r'zão. Ê seja cego, do mémo olho, se nã ser verdade!...

- E c'm' é que mecêa sôbe disso, ti Zé? Anunciaram aí na aparelhaja ó lé nalgum lado?

- Ê cátenho preciso de ninguém me d'zer isso. É uma coisa qu' ê sê munto bem e afianço. Se nã queres crer, faz-se já aqui uma aposta. O que perder paga uns copos...

E ê cá, já a ver qu' aquilo tinha malandrice, pus-me calado que nem um rato...

- Que jêto postar?!... Atã ê tamém digo qu' o homem é cego... Mái, agora tem de d'zer c'm' é que vomecêa sôbe disso.

Pensí, cá p'ra mim:

- O Raio do velho Caçapo semp'e com as dele... Inda o Toino se vai p' aí marafar, escorvado c'm' 'tá...

Más, ele arredondô a coisa:

 XV Feira dos Enchidos Tradicionais de Monchique - 2008
A aguardentinha de madronho, só de s' em-maginar, dá logo festa...

- Olha, Tóino, ele é tanto cego c'm' tu... Nã vês qu' aquilo é p'a par'cer más ingraçado? Cego só do...

Cort' ê, logo, a conversa:

- Eh, môces, vamos más é lá beber aqui mái um mosquitinho cada um!... Paga o ti Zé qu' é o que morêce ser castigado...

- Ê cá?!... Quem falô é que paga!... Que jêto ê cá pagar?!...

Ê já sabia... O homem, p'a pagar um copinho, é só lá q'ondo ele 'tá de munto boa avêa...

- Ti Manel Luís, ponha lá aqui três mosquitinhos, fazendo favor. E béba-l'e um tamém, vomecêa. Se nã pagar aqui o ti Zé, pago ê cá, nã tenha medo...

E, nesse mê tempo, o Raxinol Faduncho lá acabô o cantorío e aquela matula de gente abalô tudo, uns, caminho de casa, e ôtres, a dar mái uma voltinha lá p'r a fêra.

Bobí, paguí os calcesinhos e digo p'ra eles:

- Mês belos amigos, vô-me, tamém, ver o resto da fêra qu' isto, mái logo, fecha e inda me falta ver umas coisas. Se qu'rerem, venham daí com-migo...

 XV Feira dos Enchidos Tradicionais de Monchique - 2008
Inda pensí qu' isto eram os Pacanherros, mái, calhando, nã eram...

Más eles nã qu'seram e ê abalí, à espera d' incontrar a minha Maria im qualquer canto.

Passí àquelas barrecas todas - da Rádio Fóia, do Jornal de Monchique, da Apagarbe, os homens que já podem fazer aguardente de madronho, e tal e tal... - e inda dí com quatro môces vestidos de estudantes. Lá bem tratados iam eles, sa senhora...

Logo, cudí qu' eram uns môces lá de baxo d' ô pé de Vila Nova - do Parchal, se nã 'tô im erro - que põem umas coisas munto ingraçadas na internet e já se meteram com-migo uma vez ó ôtra, mái, calhando, nã eram.

E ê já l'es digo o jêto de ter atribuído uns com os ôtros. É que des qu' os pais deles os puseram no estudo e, atão, é certo e sabido qu' eles, agora, hã-de andar tamém vestidos desta manêra. Ora, um homem, atribói-se...

Mái, querendem ver os videos qu' eles fazem, acalquem aqui im pacanherros que vã dar ô Youtube e logo vêem s' eles nã fazem umas partes do mái ad'vertido que possa ser. Ê cá, cada vez que lá vô-me, é uma barrigada de rir im forte.

E foi assim a minha Fêra dos Inchidos. Sim qu' ê cá, no D'mingo, já nã m' aprochiguí p' àquelas bandas. Pus logo à idéa qu' havera de ser uma chusma de gente inda maior e nã m' inganí. A minha Maria é que nã gostô lá munto disso. Queria ir ver os "Anjos"...

- Oh, m'lher, alguma vez ê cá ia ver uma coisa dessas?!... S' os mês amigos sabessem disso, o qu' é qu' eles nã m' iam ch'mar... Ai os "Anjos"... Isso nã é coisa capaz cá p'ra qualquer um...

Bom... Dés l'e dê saúde, mês belos amigos.