24 novembro 2009

O 'Jeko' e o 'Kiko' fazeram a Via Algarviana duma ponta à ôtra...


O Kiko e o Jeko em Marmelete
O "Jeko" e "Kiko" fazeram a Via Algarviana duma ponta à ôtra...

Domingo passado, logo de manhãzinha cedo,fui, todo limpêro, caminho de Marmelete, cudando qu' era p'ra ir em companha do "Jeko" e o "Kiko" até Al'zur no últ'mo dia da Via Algarviana deles. Deles e da dona deles, que nunca os largô désna d' Alcôtim até aqui.

Prècuram-me vomecêas:

- E quem é essa famila?...

E ê cá dô-l'e a reposta:

- O "Kiko" e o "Jeko" sã dôs burros muntíss'mo de bem tratados - tomara ê cá ter a vida qu' eles têm... - e a dona é uma alemôa, munto boa pessoa, ch'mada Sofia, e munto minha amiga e da minha Maria.

E mecêas repisam:

- Uma alemôa?!...

- Sa senhora, uma alemôa. Mora além p' às bandas d' Al'zur, no Vale da Amorêra, fala c'm' à gente que se percebe tudo o que diz, e meté-se-l'e na cabeça qu' havera d' incher uma cerca de burros. Gosta dos animazes, o qu' é que mecêas querem. Já tem tantos c'm' sete e quer arrenjar mái uma manchinha deles...

E lá p'r ser estrangêra, nã cudem, há pôco c'mo ela. Uma pessoa do melhor que pode ser e haver!...

O Kiko e o Jeko em Marmelete
Hôve quem l'e desse cinoiras logo ô quebra-jum, tal nã foi a sorte deles...

Pôs a dita Sofia, p' à ajuda da palha e da r'ção dos b'chinhos, dé im fazer uns passêos com quem quêra levar os moços-pequenos a andarem a cavalo nos jiricos, pagandem-l'e qualquer coisinha. Coisa pôca, 'tá bom de ver...

E atão, já há uns belos tempos qu' ela andava a d'zer à gente que, em podendo, pegava num ó dôs burros dos que 't'vessem mái rijos e ia fazer a Via Algarviana com eles. Assim, já nã tinha qu' alancar com as coisas às costas. Eles acartavam-nas sem custo nenhum que têm bem força p'ra isso...

Levô a matinar naquilo, a matinar, até que se opôs, desalvorô caminho de Alcôtim e pôs-se a andar p'ra este lado, p'ra poente.

E teve sorte... O tempo ajudô e arrenjô semp'e camaradas. Nã hôve dia nenhum qu' ela nã t'vesse companha. Ora uma, ora ôtra, hôve semp'e umas amigas dela a l' ajudarem a cudar nos burros e a andar o caminho. Melhor d'zendo, as v'redas...

A caminho da Ribeira da Rocha
P'a quem já andava há duas semanas, inda tinham boa cara...

Inda cudí que, im muntos sitos t'vessem que arrenjar uns incurtadoiros ó irem p'r caminhos inda mái compridos, mái, p'ro qu' ela me contô, até mémo no bico da Picota, os burros passaram que foi uma beleza. Des que par'ciam cabras p'r cimba daquelas pedras...

De manêras que, corré tubo do melhor até chigar a Marmelete. Aí, qu' ê cá 'tava fêtinho p'a ir com eles até Al'zur, chego lá, Domingo de manhã, c'm' l'es falí logo no prencipo desta conversa, e nã é qu' um pobrezito 'tava com uma dor numa perna?!..

P'ro jêto, Sáb'do, abalaram de Monchique, panharam um gradessíssem'ô navoêro ô desandarem da Fóia p'ra baxo, os bichos iam todos suados, com aquele frio e aquela morraça, chigaram a Marmelete e um dé im coxear.

Ora, a dona, que gosta mái deles que sê cá o quem, disse logo que, assim, nã podiam seguir viaja. Nem qu' ela t'vesse que dromir ali ô pé deles na arramada qu' uma amiga lá l'e arrenjô. Salta a minha Maria:

- Ó senhora Sofia, vomecêa tamém podia fazer uma coisa: dêxava aí o coxo e levava-se o ôtro. O qu' é que diz? Logo o vinha buscar...

Atravessando a Ribeira da Rocha
D' ora im qonto, parêce uma r'bêra. Vá lá qu' a da Rocha, inda assim, nã levava munta água...

- Que jeto?!... Eles 'tão tã acost'mados um ô ôtro qu' o que f'cava nã aguentava as sôidades. Levava pr' aí a zurnar toda a nôte e a arraspar o chão todo. Até a arreata ele era capaz de partir p'a se pôr a mexer atrás do ôtro...

- Prendi-ô bem...

- Toma chó!... Chega-te p'a lá Jeko!... Nã vê? Parêce ele que percebe o qu' a gente 'tá a d'zer... Cudado nã vá ele l'e dar p' aí algum côce!... Olhe qu' ele é manso, mái em l'e chigando o sãingue às ventas...


- Atã e agora? O qu' é que se faz?...

- Querendem, vai-se todos caminho de Al'zur e eles ficam aqui os dôs qu' ê cá, amanhã, logo os venho buscar.

Nesse entrementes, já tinha havido quem fosse comprar um quilo de cinoiras e vá de dar nelas ôs dôs qu' eles até se lembiam. Um 'tava tã esgazeado com fome - ó atão era a gulosêra... - que, más um nada, nã dava uma mordizada tamém na mão dona...

Ô certo, ô certo, é que semp'e s' abalô caminho d' Al'zur e eles f'caram im Marmelete. A minha Maria teve uma paxão que mecêas nã calculam...

A caminho da Rocha
Na Rocha de Cima há uns belos amiêros. Dã uma sombra qu' até dá gosto...

Com aquilo tudo, abalar e nã abalar já ele passava das dez. Más o tempo, ora se toldava ora alimpava, o calor tamém nã era munto. D'zer a verdade, ô prencipo, até qu' inda quái que tive p'ra vestir qualquer coisa p'r cimba da blusa, mái tã penas chigamos ô apartadoiro p' à R'bêra da Rocha já 'tava más era tudo incalorado...

Daí p'ra diante, até à partilha do concelho, já prebaxinho da Néveda, foi sempre a andar de ladêra a baxo, devassar madronhêras, estevas, amiêros e coisa e tal. E posso-l'es afiançar que vistas c'm' àquelas é má d' incontrar.

Querendem ver mái mêa-dúiza de retratos, acalquem aqui na galeria dos retratos. E olhem de desta vez sã méme pôco mái de mêa-dúiza...

E até qualquer dia. Dés l'e dê saúde.

1 comentário:

  1. Que venham agora as fotografias de Alcoutim a Marmelete.
    (Conheço a Sofia da Fatacil)

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