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03 outubro 2006

No Vinte Nove, come-se, bebe-se, charola-se e dá-se banho...

Banho do Vinte Nove - Jovem participante

Este mecinho 'tava munto ingraçado. E o qu' ele nã s' ad'v'rtiu...

C'm' ê cá ia d'zendo, aquilo foi chigar ô Vau e, num 'stantinho, já 'tava tudo a c'mer do bom e do melhor. Tôd's trazeram d'comer que dava p' ô drôbo da famila incher bem a barriga e p'a mái uns q'ontos.

E andavam, a bem d'zer tôd's, num correpio bispando o que cada um tinha levado e provando o farnel uns dos ôtr's. Mái sô franco. Os más andavam jogados às papas, que 'tavam lá dôs tachos delas, umas com t'mates e ôtras béque-me tamém, qu' aquilo até davam gosto.

Logo, 'tava tudo esfòmeado, puseram-se a c'mer, nã s' ôvia quái barulho nenhum. Nã conhecem aquele dito dos antigos qu' "ovelha que berra, bocado que perde"?... Mái, d' ora im q'onto, semp'e um ó ôtr' dizia assim uma chalaça. Tirando isso, 'té se dava ôvisto o barulho da tel'visão lá d' "Os Costas" a atazanoar os ôvidos d' uma pessoa só com aquelas parvoêras qu' as tel'visõs agora dão.

Mái, passado um belo pôco, com a barriguinha más aconchigada, já tudo falocava bem alto e com fartura e a coisa já tinha ôt' jêto. Inda p'ra melhor, rompé o fole a tocar - um mecinho inda novo mái que s' ajêta muntíss'mo bem - e, 'tá bom de ver, a festa com fole é logo ôtra coisa...

Banho do Vinte Nove - Praia do Vau

O tocador era um mecinho novo, más olhem que tocava munto bem...

Fui aprevêtando a tirar uns q'ontos retratos, mái atão de nôte nã fica nada de jêto, e o que l'es sê d'zer é que nã f'quí a perder tudo. 'Tá bem qu' os retratos sã o que 'tá à vista, mái os calcesinhos dela, bolos e ôt'as coisas qu' a famila 'tava semp'e a me dar, esses já cá cantam... E era tudo material de pr'mêra.

Os bolos, tudo fêto à manêra antiga, os dec'meres, tamém e o madronho nã se fala... Bem agraduado, macio e com um gosto qu' até chêrava na boca. P'a melhor d'zer, ele até estralava era às goélas abaxo...

Havia menino que bobia cada calço duma assentada, qu' é c'm' à gente usa a fazer p'r cá, e ô fim até se lembia e, p'lo jêto, f'cava-l'e luzindo o olho p'r mái uma copadinha...

'Tava lá um amigo com uma aguardente, atão, qu' até as m'lheres gostavam. Logo q'ondo s' olhava p' à garrafa, 'mar'linha c'm' 'tava, béque-me par'cia melosa, mái, ô bober, aquilo era madronho e do melhor. Ó ê cá m' engano munto ó ela, s' a gente a pesasse, nã dava menes duns 21 degraus...

Banho do Vinte Nove - Vai um calcesinho de madronho?

Quem é que l'es disse qu' as m'lheres nã gosta de b'ber a su copadinha?...

Mái dêxemos lá isso e passa-se adiante. É qu' o melhor inda 'tava p'ra vir. Despôs da barriga chêa, com as modas qu' o tocador tocava, a famila dé em s' apròchigar lá mái p' ô pé dum estrado de madêra que 'tava logo ali à rés do restaurante.

Aquilo há-de ser p' ôs 'strangêros passarem ali de pata descalça e nã atancharem os pés na arêa, na hora da calma, qu' ela há-de 'tar tã quente qu' até dá p'a l'e esfolar os calos... Mái tamém se tem que ter conta d' andar ali descalço, qu' aquelas ripas, nã l'e garanto que nã larguem uma pua, uma vez p'r ôtra, que s' atanche na pele.

Pôs, olhe, aquilo, nã demorando nada, parte deles, já 'tava tudo engalf'nhado uns nos ôtr's a balhar. Uns im cimba do estrado, ôtr's méme na arêa, mái acertava tudo bem que nem uns danados... E valsas e tudo, hã!...

Atã e nã era ingraçado ver aquela famila toda a balhar vestidos daquele jêto - os homens em cirôilas e as m'lheres em combinação?... Olhe, que só no Vinte Nove é que se vê uma coisa destas...

E, despôs, c'm' 'tava tudo de boa avêa, cada qual diz as maiores parvoêras e faz trinta p'r uma linha. 'Tavam lá umas munto marafadas p' à brincadêra, a pásnas tantas, encambulharam-se, cai tudo num fêxe p'r aquela arêa. Aquilo é que foi uma barrigada de rir...

Banho do Vinte Nove - O baile Banho do Vinte Nove - O baile Banho do Vinte Nove - O baile

Balhava tudo munto bem e ad'v'rtiram-se o mái que possa ser...

Inda bem nã tinham dêxado de balhar, qu' o tocador tamém tinha precisão de sossegar um coisinho, desata tudo a prècurar as horas. Ora, aquilo já era noite adentro, más inda nã se tinha chigado à mêa-nôte. Era p' aí umas onze e tal.

De modes que, c'm' só im o reló'jo tapando bem a mêa-nôte é que se podia ir p' à água, que só aí é que já era dia Vinte Nove, aquela malta mái gozona levaram inda ali um belo pôco na galhofa e ê cá fui tirando mái uns retratos.

E olhem qu' aquilo, vist' ô pé, até que tinha bem munta graça. Ê, ás vezes, da graça que me dava, até me descangalhava a rir e até os retratos se me estragavam. Qu' isto, tamém, apr'vêtam-se pôcos, mái, nalguns, semp'e se conhêce as caras...

Banho do Vinte Nove - Praia do Vau Banho do Vinte Nove - Praia do Vau Banho do Vinte Nove - Praia do Vau

Ele havia lá uma jolda delas qu' eram danadas p' à brincadêra...

Ô soar da mêa-nôte, já 'tava tudo à rés da água, foi só dar mái um passinho ó dôs à frente e meter os pés de molho. E fiquem sabendo qu' aquilo foi uma chusma de gente a antrar ô mar adrento qu' ê nã pensava.

'Tá bem que só dôs ó três é que margulharam, os ôtr's andavam p'r 'lí a chap'nhar e, mal a água l'e chigava preciminho dos artelhos, já s' ensiavam tôd's. Mái ninguém pode d'zer qu' eles nã foram ô banho...

Cá p' ô mê lado é qu' a coisa nã andô lá munto bem. Atão nã querem lá ver qu', embasbacado c'm' andava a tirar retratos, nem me vê à idéa tirar os sapatos e arregaçar as calças?!... Nã é qu' ê fosse lá p'a mê da água mái funda, qu' andí semp'e ali à babuja, mái é que, q'ondo mal dí p'r isso, vem uma r'bêrada d' água - c'm' d'zia o ôtro - e, p'ra baxo dos joelhos nã me dêxô nada inxuto...

Punhana!... Inda dí um salto em q'onto pude, mái de munto me serviu... Logo, que já tinha os sapatos bem incharcados, e despôs, que nã dí salvado a água e f'quí com os pés drento dela ôtra vez.

Mái tamém l'es digo. Pôca d'frença me fez ó nenhuma. Ele, frio nã fazia, e com os caláiços d' aguardente qu' ê tinha no bucho, calor era o que nã me faltava. De manêras que, só o mal que fez foi que tive d' andar o resto da nôte com os pés mái pesados e, consoante dava umas passadas, lá s' ôvia chaloc-chaloc, chaloc-chaloc...

E más ingraçado é qu' hôve menino que antrô p' à água à mêa-nôte e só de lá saíu nã sê se nã saria aí já p' ô lado da mêa-hora... Môç's mái nôv's, 'tá bom de ver, qu' os mái antigos, a cabo dum pôco, já batiam o quêxo e t'veram que s' ir alimpar e mudar de farpela...

Q'ondo vim prê acima, até dí com umas moças, todas jêtosas, a s'enxugarem ô pé duma luz, que me dé cá uma vontade de rir... 'Tavam bem caçadas, sa senhora...

Banho do Vinte Nove - Praia do Vau Banho do Vinte Nove - Praia do Vau Banho do Vinte Nove - Praia do Vau

No Banho do Vinte Nove vai-se tôd's p' à água. P'r mái que nã seja, molha-se os calcanhares. E, despôs, há quem se vá inxugar...

E pronto. Assim desatô tudo a afêçoar as trôxas, a limpar tudo e a arrumar as cadêras da méma manêra qu' as tinha incontrado. Em coisa d' um pôcachinho, abalô-se tôd's caminho das caminetas e dos carros e a praia lá f'cô à nossa espera p'a pr' ô ano.

Assim se tenha vida e saúde, que lá 'taremos tôd's, sem falta, ôtra vez e, podendo ser, com mái alguns amigos qu' este ano nã foram. Uns que nã puderam, ôtr's que nã saberam e ôtr's que qu'seram.

E com respêto ô Vinte Nove, fic'-me p'r 'quí.

S' haver quem goste de ver o resto dos retratos, fazendo favor, acalque aqui - ver retratos - e veja à su vontade todos q'ontos quêra.

P'a tôd's munta saúde. Fiquem-se com Dés.

02 outubro 2006

O Vinte Nove é um banho que vale p'r trinta...

Banho do Vinte Nove - O banho

No Vinte Nove toda a gente vai à água. Nem que seja só até ôs artelhos...

A famila cá da serra, nôtres tempos, nã tinha posses p'a ir dar banho ô mar tôd's dias ó todas semanas, c'm' agora muntos fazem. Era preciso comprar uns calçõs de banho, pagar a um carro-de-besta ó, mái tarde, o b'lhete da carrêra e, munto pior, perder um dia de trabalho, numa altura do ano que nã há vagar p'a coisíss'ma nenhuma.

E atão, o qu' é que s' haveram d' alembrar. Nã sê lá quem foi nem q'ondo. O certo é qu' inventaram qu' indo dar banho no vinte nove de Setembro, aquilo valia p'r terem ido os dias tôd's do mês. E desataram a fazer assim, qu' a famila via aquilo c'm' se fosse mái que certo.

Na bésp'ra à nôte, despôs da cêa, pegavam nas sus trôxas - uns cestos, cestas ó canastras de verga, umas bolsas de ratalhos, umas alcofas d' emprêta, uns tachos d' arame, umas panelinhas de ferro e umas plenganitas de barro - chêazinhas dos melhores dec'meres que sabiam fazer e lá abalavam caminho da Praia do Vau.

P'a acompanhar, nunca se desqueciam dum garrafanito de vinho, quái semp'e d' acolhêta, e, munto menes duma garrafinha de madronho, de verga fina e rolha de corcha, fêta à mão com a faquinha d' als'bêra, que cortava que nem uma lanceta, e um c'pinho de vrido grósso que servia p'a tôd's boberem o sê calcezinho dela, em chigando à praia e méme logo durante o caminho, que semp'e levava umas belas cinco ó sês horas, perto ó certo.

Máicudem, as m'lheres levavam quái um dia entêro a fazer dec'mer... E tudo coisas que, só de me virem à idéa, me fazem cr'cer água na boca. E senã, vejam lá se tenho ó nã r'zão, despôs d' ê l'es d'zer o qu' eles usavam a levar.

Olhe, era désna de papas de toda a q'ôlidade - moiras, com tomates, com côve e méme soltêras - fêjão com arroz - bem temp'radinho com as carnes todas - fresneco, piques na banha incarnada, chôriças e morcelas, sardinhas albardadas, f'lhózes de pol e das de mortepórque, zêtonas - britadas ó de conserva com cinoiras - bolos-d'-alforge, bolos-de-lar, ê sê cá o qu' é qu' eles nã levavam más...

Em chegandem ô Vau, já às tantas, p'a verem alguma coisinha acendiam as alenternas a pitrol, estendiam as toalhas p' aquela arêa afora - cada uma apresentava a mái bonita, umas de pano ôt'as de linho - prantavam-l'e o d'comer todo im riba e vá de c'merem e boberem, cada qual o mái que podia...

Tocadores de fole nã faltavam. Era raro o carro-de-besta que nã trazia um. Assim qu' o v'nhito e o madrondo chigavam à cabeça, os homens davam em puxar as moças p'a balhar, aquilo era uma festa...

Tã penas amanhecia - melhor d'zendo, inda entes do romper d' arora - lá ia tudo caminho da água p'a darem banho. Banho... P' ali s' arrabolavam na arêa, adonde a água mal l'e tocasse nos calcanhares... E q'ondo calhava a vir uma onda assim más alta, andava logo tudo de zambareta e ensiavam-se tôd's qu' até custavam a t'mar ar.

Uma ocasião, levaram um meçalho-pequeno qu' inda nunca lá tinha ido. O pobrezinho só 'tava ac'st'mado a ver água aqui no barranco do Ambróizo, p' ali andava a brincar, desafrontadamente, na arêa molhada, assim à babuja, q'ondo nisto arrebenta uma onda das grandes, qu' a maré 'tava a incher, passa-l'e p'r cimba, vai de raboleta, até o perderam de ver...

Q'ondo a água decé p'ra baxo, ele alevanta-se todo ensiado, a esfregar os olhos, já com uma bela golada d' água salgada no bucho, quái que custava a t'mar ar, toma tino, volta-se p' à famila que 'tava tudo a olhar p'ra ele e a rir, e diz munto ensampado:

- , raio!... Que grande r'bêrada!...

Aí é que se descangalhô tudo às carcachadas. Havia menino qu' até se espòjava na arêa com a grande barrigada de rir que panhô...

Mái, voltando atrás, sabem p'r qu' é qu' eles faziam esse trabalho de dar banho inda lusco-fusco?... Ê vô-l'es d'zer, qu' isto tudo um jêto.

É que lá os marujos de Vila Nova - os algarvís - usavam a ir judear com a famila da serra p'r mode a gente nã saber abanhar e se ir p' à água vestidos daquele jêto - os homens em ciroilas e camiseta e as m'lheres im combinação ó, algumas que tinham, im culotes e colête.

E, nã contentes com isso, em gozo, inda ch'mavam à gente "os parentes", p'r mode se ser quái tôd's primos e se tratarmos p'r parentes uns com os ôtr's.

E, atão assim, q'ond' eles s' alevantavam p'a irem p' à praia, já a gente se tinha governado e posto a trôxa toda nos carros-de-besta e lá se voltava caminho do monte, sem eles terem inchido o papinho de rir às nossas tenças.

Mái, q'ondo calhava, a gente tamém antrava com eles à nossa manêra. Muntos andavam descalços e com as calças, que nem l'e chigavam ôs artelhos, siguras p'r espensóiros, com os fundilhos arremendados e debôtas de tant' ô uso. E a gente d'zia:

- Atã, pá, vás ô barbigão?!... - Qu' era c'm' quem d'zia qu' ele já tinha as calças arr'gaçadas p'a nã as molhar...

De manêras qu' o Vinte Nove era assim há mê cento d' anos p'a trás e despôs acabô. Más, agora, faz já uns sete ó oito anos, a Junta de Freguesia de Monchique dé em pedir as caminetas à Cam'bra e tem convindado a famila toda que quêra a s' irem ad'v'rtir e fazer uma amenção do Vinte Nove, nesses tempos.

E nã l'es digo nada... Neste Vinte Nove, ajuntaram-se três caminetas chêazinhas de famila e inda os que par'ceram nôtras vias. Ê cá nã nos contí, mái, ó munto m' engano ó 'tavam lá aí p' ô lado d' uns dôs centos de famila, se nã fossem inda más...

Pôs, aquilo, o ajuntamento foi no largo adonde apoisam os helicópt'res e uma parte da famila já vinham vestidos a precêto. Vô-l'es amostrar uns q'ontos retratos dos qu' ê cá tirí, ruinzinhos, 'tá bom de ver, qu' aquilo era de nôte e nã fêto melhor.

Banho do Vinte Nove - Abalada

Ele hôve quem abalasse de casa logo vestido a precêto. E fez muitíss'mo de bem...

Tã penas assubiram tôd's p' à camineta, tava-se aqui 'tava-se logo na Praia do Vau, qu' isto a lonjura nã é munta e, com as vias que há, hoje em dia, nã custa nada. Q'ondo damos p'r isso t'á-se no destino. Béque-me já toda a gente prosa e tudo. Olhe que, q'ond' ê era novo, via-se muntas vezes a famila com a galga de fora das j'nelas da carrêra e vá de ch'marem p'lo grigóiro...

Ô chigar ô Vau, foi ôtr' empeço. P' à famila sair toda e tirar as trugias do porta-bagajas, levô-se uma remessa de tempo. Más a más que nã havia lugar p' ás caminetas todas, ô méme tempo, ali à rés da praia. E, a verdade que se diga, nã era só o pessoal ser munto, é que tamém ia tudo bem carregadinho de farnel, lá isso ia...

Banho do Vinte Nove - Chegada à Praia do Vau

É qu' era bem munta famila e levavam munta trugia...

Mái, assim que desandaram tôd's p' à praia, aquilo c'meçô o fand'liro... Avençaram com aquelas cadêras, ó camas ó lá o qu' aquil' é, qu' "Os Costas" têm lá na praia p' ôs 'strangêros s' encostarem e panharem sol naquela lombêra, ajuntaram-nas, estenderam-l' as toalhas im riba e vá de espalharem d'comer à farta p'r tod' ô lado...

Banho do Vinte Nove - Praia do Vau Banho do Vinte Nove - Praia do Vau Banho do Vinte Nove - Praia do Vau

Tã penas lá chigaram, estenderam as toalhas e dec'mer nã faltava im banda nenhuma...

Más, o resto, logo l'es conto amanhã, se ser coisa que quêram saber.

E, despôs disso, inda tenho que falar tamém na descasca de Marmelete...

Fiquem-se com Dés.