06 setembro 2006

Marmelete: A Fêra e o nosso ad'v'rt'mento da tarde

Marmelete - Feira anual

A fêra já nã é c'm' nôtres tempos, más a gente ad'verte-se à nossa manêra. É até mái não...

C'm' ê cá já disse, no dia da fêra 'tava uma soàlhêra tã grande ó tã pequena qu' um homem, méme com um belo àbirum na cabeça, nã dava conta daquilo. Chigava até ôs miôlos duma pessoa...

Inda pr'a más, a fêra nã tinha nada que ver. Eram p' ali três ó quatro tendêros com as òcharias do c'stume. Carrocel já nã há, umas blancias p'a fazer uma arracha tamém não, o reclame da banha da cobra inda munto menes... O qu' é uma pessoa via lá?!...

Ô fim da missa e, em acabando de c'mer uma buchinha qu' a minha Maria levô, acaçapí-me ali ôtra vez na desplanada e vá mái uma cervejalha p'a mim e um sevenáp p' à minha Maria. Tudo bem fresquinho, qu' o calor era uma coisa p'r demás.

Neste mê tempo, aquilo já era mêa-tarde, tinha-se ajuntado bem munta famila - tudo nos cafés - nem lugares de vago à sombra havia, fosse adonde fosse.

- Maria, s' a gente se fosse ali p'a drento semp'e nã se panhava tanto calor. Isto aqui até se custa a tomar ar.

- Ê dá-me vergonha. Aquilo 'tã ali aqueles relaxados tôdes...

- Ó m'lher, nã digas isso!... Atã nã vês qu' aquilo sã bons amigues e, uns q'ontos, inda sã nossos parentes?...

- Más ê nã vô p' ali. Aquil' é munto escuro.

Ô méme tempo, o carro do Zé Manel a aparar quái im frente do café. Pensí:

- Já 'tô governado. Tenho companha p' ô resto da tarde e, calhando, via p'a voltar p'a casa.

Arrulho logo d'rêto ô carro, entes qu' ele s' assentasse nôt' lado:

- Eh, Zé Manel! Anda cá aqui ô pé da gente e bebe-l'e uma coisinha que t' apetêça.

E ele vêo.

- Atão, já 'tás melhorzinho?

- Mái que conversa é essa?!... Ê nã 'tô doente...

- Nã t' ofendas... Mái, inda agora, q'ondo trôveste o tê pai, vinhas assim um coisinho p' ô molengo...

- Qual o quem! Aquilo era do sol que nã me dêxava abrir as vistas...

- Olha lá, dêxamos lá isso da mão e diz lá o qu' é que queres b'ber?

- Ê sê cá o que beba. Béque-me só m' apetêce é b'ber água... Mái, vá lá uma pequenalha.

Abalí, fui lá drento, peço duas cervejalhas pequenas, olho lá p' ô canto, quem é qu' havera de lá 'tar? Uma mesa chêazinha tudo de bons amigos. O Parente Tóino de Mortal foi o qu' ê vi pr'mêro, mái aquilo era uma preçanada deles, désna de parentes da famila das Vinhas, da R'Nova, do Brandão, do Val' d'Água, ê sê cá...

- Ponha tamém umas b'bidas além p' àquela mesa, qu' ê já pago.

- P'a tôdes?!... - Responde-me a menina de lá de drento do balcão.

- Sa senhora, ponha e nã tenha medo... Ê já pago tudo.

E lá abalí, com as cervejalhas, p' ô pé do Zé Manel e da minha Maria, já com ela fisgada.

- 'Tá aqui, Zé manel.

- E 'tá bem fresquinha. É assim qu' ê gosto delas.

Faço-me assim um coisinho desbercebido, volto-me p'a ele e dig'-l'e, de chofre:

- Zé Manel, se nã te fazesse d'f'rença, ias com-migo ô Forno Velho b'scar o fole do Parente Tóino de Mortal? É qu' ele 'tá ali drento e tocava aí umas modas p' à gente...

- Ai 'tá? S' ele qu'rer, é p'ra já.

Tã penas ele me diz isto, abalo caminho da mesa deles:

- Eh, famila!... 'Tá tudo bem c'm' parêce, ó quém?

- Eh, Refóias... Foste tu que mandaste estas b'bidas p' aqui'

- Olhem, ê venho aqui apresentar um caso. Já tenho ali uma via à espera p' ô ti Tóino ir com-migo b'scar o fole dele a casa e tocar umas modinhas p' à gente... S' ele qu'rer...

Punhana!, aquilo foi tôdes à uma a bater palmas... Ele inda s' amolgô um coisinho, mái, despôs, nã teve reméd'o senã d'zer que sim.

E, p'a encurtar de razõs, em menes d' um foguete, já se tinha ido ô Forno Velho e já cá se 'tava com o sê lindo fole, encarnadinho qu' até luzia, a dar os pr'mêros toques p'a afinar. Qu' o homem, no caminho, foi-me d'zendo que já há uns belos tempos que nã pegava naquilo.

Enq'onto nã se jogava a tocar uma moda, o Parente Antóino Mortal enrolava um cigarrinho de tabaco d' onça...

Aquilo foi o tempo d' enrolar um cigarrinho de tabaco d' onça, b'ber um solvinho d' emperial e ôvir um d'chote ó dôs, e já 'tava pronto p'a arrencar.

Diz o ti Manel da P'rtela Baxa p'ra mim, na galhofa, p'a entrar com o Parente Tóino:

- Ó Refóias, mái atã tu nã tens vergonha de fazer uma parte destas à gente?!... Já nã basta o ter qu' o aturar q'ondo ele vai lá à minha casa, senã hoje, em dia de fêra, que se 'tava aqui tã sossegadinhos a palear uns com os ôtres...

- Dêxe lá o homem tocar, qu' isto é uma festa e o Parente Mortal sabe tocar aí umas modas qu' é uma classe...

- Cala p' aí essa boca... Ele toca menes qu' o ti Chico Bêço, Dés l'e perdoe, q'ondo morava sòzinho lá naqueles barrancos e tinha aquela concertina mái velha que ele...

- Que jêto?!... O homem é o melhor tocador de fole qu' há aí numa preção de léguas em redor!... Nem m' alembro d' ôtro assim... Vá lá, parente, toque lá 'í uma das suas, p' ôs calar...

E ele, atão, fez-me a vontade. Arrenca com um corridinho, assim se calô tudo naquele café... 'Té os da desplanada se vieram assomar cá p'a drento. Ajunta-se um gentío de roda dele, uns batiam palmas, ôt'es balhavam, um ó ôtro d'zia umas chalaças p' à gente se rir, já nã no dêxavam aparar.

Atrás duma era ôtra e vá bobida p' àquela mesa... Ê cá nem m' assentí. Ó atão panhava lá uma pelhega que nã me dava lembido, qu' aquilo era tudo a pagar bobida p'a quem qu'sesse.

Tocador de fole - Marmelete Tocador de fole - Marmelete

'Tava tudo munto ad'v'rtido. Uns batiam palmas e ôtres balhavam. E tamém b'biam umas cervejalhas...

E a tarde foi-se passando, até qu' a minha Maria s' alembrô qu' o Chico Barata ia cantar no ôt'o café, logo preciminho. Bem sabia ê cá quem era o Chico Barata, mái des que l'e tinham dito qu' ele cantava munto bem e que tinha p'a lá umas moças a balhar qu' era uns mimos, e tal e tal...

P'a nã falar qu' o Parente Tóino já 'tava a f'car escalfado de tocar tanta moda e precisava de desòpilar um coisinho. Méme o resto da famila tamém já l'e 'tava a dar cobiça de panhar um coisinho d' ar fresco, qu' o sol já se tinha posto e corria uma araja qu' até consolava.

Más isso cont'-l'es ê a seguir, qu' é p'ra isto nã f'car comprido de más e mecêas nã l'e custarem tanto a ler.

Binté amanhã.

7 comentários:

  1. Parente, tou vende que Marmeletem se tá a tornar uma cousa fina.Ora até o Chique Barata(qu'agora tá na berra da malta nova),foi cantar lá...
    Pôs neste Verãojá o ouvi e gosti munte. Foi num hotel qu'é Boca do Rio, na Mechenhêrinha, lá méme opézinha da pechinha.É cá fui com meçada amigues do meu e até tava aparvalhade com tanta luz e luxe e raio das bobidas é qu'eram carotas que nem umas marafadas.
    Fique méme sadesfête do parente gozar tante e amostrar ser tã feliz. Que Dés o conserve, mé bel'amigue.
    Até mai logue ó até amanhã

    O Campaniço

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  2. Sr Mad

    Costumo visitar o seu óptimo blogue e ler todos os comentários que lhe são feitos.
    Para ser franco, fico maravilhado e acho-o de grande riqueza etnográfica e antropológica.
    Aprendo muito e recordo coisas que havera esquecido.Também aprendo e me divirto com os comentários dos seus leitores, mas há um em especial a que acho muita graça :-O Senhor " Campaniço Monchiqueiro", como ele se apelida.
    É que sem ser malcriado, é mordaz e vai dizendo das boas, conhecendo tudo e todos.
    Ambos conhecem bem as pessoas e os costumes dessa bela terra. Quanto a mim estão de parabéns e façam o favor de continuar!

    Muita saúde são os meus votos

    O Fisgas

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  3. Mê belo amigo Fisgas
    Munto l' agradêço as sus v'sitas e tamém o sê comentáiro tã porrêro.
    'Teja certo que sã méme as v'sitas e os comentáiros de tôdes os que vêm com-m' à mecea que me inflóem a d'zer mái uns d'chotes.
    Dés l'e pague.

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  4. Oi Parente

    Acabi agorinha mémo de ver o dequementáiro do nosse amigue Fisgas e tenhe a dezer que fiqui tôde enrrascadinho plo qu'ele escreve. É qu'é cá nã sou parve de tôde e bem sê que nem chegue os calcanhares do parente. Mecêa é que escreve umas cousas qu'até dá goste e tem umas idéas marafadas, agora é cá só arremendo umas palavrecas...
    O nome dele é qu'é bem caçado e alembra-me o tempe da minha mecidade, qu'ondo se fisgava a passarada, má agora nem se pode falar nisse, qu'é pribide, os animalezinhos tã tôdes pretegides, e até concorde com essas lês.
    Nã sê s'é com o passar dos anes, má tou más sensivle, que já nã era capaz de fisar ó armar ós passares.

    Boa nôte e espero que já teja no vale dos lençós.

    O Campaniço

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  5. Amigo Campaniço
    Nã seja assim tã vergonhose qu' ê já vi que mecêa conhêce quái tudo o que diz respêto cá à nossa serra, seja ele sitos, famila, casos que se deram e p'r 'í diente.
    Inda nã me desem-maginí do ver tamém com um blog seu a falar de Monchique ó do que vomecêa munto bem l' apetecer.
    P'r mái que nã seja, vá d'zendo quasequer coisa aqui no Parente da Refóias e nôtres qualqueres que goste.
    Nã se descude é munto com a famila lá do Alferce ó d' ôt'es lades, qu' isto é tudo bons amigues e nã hã-de gostar de certas coisas que mecêa diz, q'ondo calha...
    Passe munto bem, amigo.

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  6. Parente

    Munto l'agradeço os repairos que mecêa me faz, precása d'é cá ser um pedaceco desbucado, más iste né pre mál e nã envente nada, só digue o qu'é cá oiço à outra malta, s'é mintira nã é minha.
    Q'onto a é cá ter um blogo, isse nã pode ser, que nã tenhe instrução nem saber pa tal cousa. É preciso munta enmaginação e é nã tenhe...S'u parente nã s'emportar, vou metendo umas puazinhas, imbora às vezes note que sou rençôso, má qu'onde nã gostar pode dezer qu'é cá nã m'ofendo...

    Deseje-le uma santa nôte


    O Campaniço

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  7. Mê belo amigo Campaniço
    Nã me leve a mal do qu' ê disse qu' a minha tenção era ser só uma chalaça.
    E fique sabendo qu' ê faço até munto gosto que vomecêa vá d'zendo aqui das suas e q'onto mái melhor.
    A nossa serra bem precisa de quem s' emporte com ela.
    Haja saúde.

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Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"