15 setembro 2006

Monchique: Um Tocador de Fole que já nã dé vindo

José Alves 'Filipinho' - Monchique

Este tocador nunca mái dé vindo ô Encontro de Acordeonistas de Monchique, désna d' há uns belos anos.

P'r mode um comentáiro do amigo Campaniço, alembrando um parente dele que usava a vir ô Encontro d' Acordeonistas de Monchique - o amigo Zé Alves, mái conhecido p'r "F'lipinho", Dés o tenha em bom lugar - descorré-me a escrever aqui umas coisécas a respêto dele, qu' a gente nunca se deve desquecer dos amigos que já lá foram.

Ist' é uma manêra do alembrar e, s' ele 'tá lá im Cimba a ôvir a gente, que 'tá, sabe que s' era bem amigues e, nestes anes que já passaram, tem-se tido muntas soidades dele, do sê folezinho e das charolas e travessuras qu' os amigos, q'ondo calhava, l'e faziam, tudo p'r graça.

P'a falar verdade, mê belo amigo, nã se podia d'zer qu' ele fosse assim um tocador p'r 'í àlém, mái p'a uma entretenga duns q'ontos amigos, até que servia muntíss'mo de bem. Ele, umas modas, semp'e tocava, ôt'as arremedava e aquilo era semp'e um pagode.

Pôs o amigo F'lipinho vêo das Águas Alves morar p' ô Brejo, além na estrada do Alferce, e, c'm' o parente dele diz, gostava de bober a su copadinha. Até que l'e calhô bem que, arrumadinho à casa dele, havia logo uma venda. Aquilo era só andar p' aí uns cem metros, pôco más, e já 'tava...

Uma ocasião, 'tava ele já escorvadinho nessa dita venda, junta-se lá uma malta amiga, e vá de atiçar o F'lipinho p'a tocar uma modinha ó duas.

- S' ires b'scar o fole e tocares umas modas, cada um da gente paga-te uma cervejinha...

E ele d'zia que não.

- Vá que tens aí cerveja p'a bober o resto da tarde. E, ô fim, inda te pago más uma das médias Sagres...

D'zia um p'a entrar com ele, que já sabia qu' ele nã bobia Sagres nem p'r nada.

- Ê cá nã bebo Sagres... Ê só bebo Cristal, das pequenalhas.

Respondia ele, entortando a cabeça p' ô lado e fazendo um miéco com a boca, ô mémo tempo qu' os olhos piscos l'e pastanejavam que nem uma fita. Naquela vez, nã 'tava d' apetite de tocar. Via-se mémo.

Até qu' um qualquer, vendo que nã no dava fêto ir b'scar o fole, s' alembrô duma brincadêra qu' ele tamém usava a fazer, quái semp'e p'a ganhar uma cervejalha ó duas.

- Olha, atão se seres capaz d' arrojar as nalgas désna daquela parede até ali ô mêo da casa, com as mãs e os pés no ar, ganhas, na méma, uma cervejinha de cada vez que fazeres, qu' a gente paga.

- Isso 'tá bem. Isso faço, mái têm que ma pagar cada um a sua...

- Faz lá, qu' a gente, despôs, paga. Uma p'r cada vez.

- Eh'q!... Vocês querem-m' é ver fazer e, despôs, dã-me o cabaço e ê dô o tempo p'r mal empregue...

- Nã senhora! A gente diz que paga, é que paga... Menina, ponha lá aí uma cervejinha p' ô Zé Alves, fazendo favor. S' ele fazer o combinado, pago ê cá, s' ele nã fazer, paga ele.

- 'Tá combinado. Venha ela, qu' ê bebo-a logo.

E emborcô-a duma assentada qu' aquilo par'cia a garrafa que 'tava rôta...

P'a ganhar uma cervejinha, o amigo F'lipinho ia arrojando o rabo, ôs pulinhos, até chigar ô mê da casa...

Logo a seguir, joga-se de cu ô chão, desata ôs pulinhos e vá d' impar - õi!, õi!, õi!... - e assim chigô ô mê da casa, em menes de nada.

Alevanta-se, 'tava tudo às carcachadas, volta-se p'a tôd's e diz:

- Vá, quem qu'ser ver ôtra vez, pague mái uma cervejinha... Apr'vêtem agora que, mái logo, já nã há...

- Atã, vá ôtra, qu' agora sô ê que pago. Pode abrir nas mesmas condiçõs d' inda agora. Más, agora, põe-se uma marca ali no mê da casa e tens que chigar bem até lá...

- P'ra cá com ela!... Isso nã me dá cudados nenhuns.

E pegô numas coisas que 'tavam p' ali im cimba duma mesa - um prato e um copo e nã sê mái quem - e pô-se-as no mê da casa.

A m'lherzinha abre a cerveja, tã penas a põe im cimba da mesa, ele joga-l'e as mãs e baldê-a num 'stante. Nã era que fosse munto c'stume dele bober assim as cervejas num de repente, mái daquela vez, pendé pr' ali.

Até se dava o caso, as más das vezes, ele levar ali amarroado, ô pé do balcão, com uma cervejalha na mão e nunca mái a acabava... Aquilo aquecia, f'cava que par'cia ôrina de burro, com l'cença da palavra, e ele semp'e no mémo andamento molengão.

E vá mái uma corrida. A cabo dum minuto ó menes já ele tinha fêto o caminho todo.

- Querem más? Querem más?... Agora só s' um me pagar ôtra e vir com-migo p'a ver s' é capaz. Inda l'e dô mê metro d' avanço...

- Alguma vez?!... Atã pago-te a cerveja e inda tenho que sujar os fundilhos das calças aí no chão... Toma chó!...

- Nã sê... D' ôtra manêra nã faço. O qu' é que vocêas cudam. Pensam qu' isto é bom de fazer? Expr'mentem que logo vêem...

A sorte é que 'tava ali um meçalho-pequeno todo influído com a aquilo e of'r'cé-se logo p'a ser ele a ir.

O F'lipinho, munto a custo, mái vendo que nã tinha otra manêra de bober mái uma cervejinha, lá disse que sim e, mal s' aprecatô, já tinha mái uma garrafa aberta ô pé dele.

- Ai já aqui 'tá ôtra?... 'Tá bem...

Pô-se-a ôs quêxos, foi um vê se t' avias. Despejô-a às goélas abaxo sem tomar ar vez nenhuma. Tã penas acabô, t'mô fôl'go, jogô-se ô chão, disse ô meçalho p'a fazer o mémo e lá abalaram os dôs a pedir meças um ô ôtro.

E olhe qu' o meçalho nã l'e f'cô munto atrás, nã senhora... Se nã é o F'lipinho pertar com ele méme ali quái ô fim, aquilo 'tava-l'e ruim... Ganhô-l'e p'r pôco.

José Alves 'Filipinho' - Monchique

À tercêra, até um moç'-pequeno foi exp'rimentar tamém a ver s' era capaz. E fez boa figura...

Foi mái uma risada das grandes, uns batiam palmas, ôtros faziam cachamôrra dele, ôtros ind' ô desafiaram p'a mái uma virada e o qu' ê sê d'zer é qu' a galhofa inda durô uma preção de tempo, 'té qu' o F'lipinho já afègava e quái que nã dava tirado o rabo do mémo sito.

E p'r 'qui me fico, qu' isto foi só p'a alembrar um tocador de fole de Monchique que tamém gostava d' ir ô Encontro d' Acordeonistas e dêxô d' ir já há uns q'ontos anos p'r mode a pôca sorte que teve, qu' a vida l'e custô.

Mái, cá os amigos nunca se vã desquecer dele e, inda menos, nesta ocasião.

Muntas rec'mendaçõs p' ô amigo F'lipinho que Dés tem.

E p'a vomecêas munta saúde, até qu' a gente se veja.

6 comentários:

  1. Ainda que caricata e muito cómica, esta homenagem ao seu amigo F'lipinho torna-se bonita e enternecedora. Monchique terá perdido, pelo que suponho das suas palavras, uma pessoa única, capaz de transmitir alegria a todos quantos estivessem em seu redor, coisa tão rara quanto valiosa.
    Ainda bem que nos recordamos daqueles que tantos momentos agradáveis nos trouxeram; que a memória nunca os deixe morrer.

    A sua amiga.

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  2. Oh mé ric'amigue, nem le dô encracide, come tou de veras sadesfête da atenção que teve pra mim. Munt'obrigadinhe, munt'agradecide de ter prantado aí esses retrates do mé bele parente, que Dés tem e duma manêra tã trageca...Até se m'arrasa os olhes d'água, só de m'alembrar daquela triste nôte e da minha querida parenta Bia do Breje, a viúva.É que coitada, tem side mesme uma desenfeliz, nã le chigou a doença e morte do únique filhe, senã perder o home dela, defronte da porta, daquela manêra...
    Uma vez, numa morte pórque tamém vi essa façanha dele, d'andar pa casa a fora só com o cú no chã e aquile foi uma pagodêra, toda a gente queria despermentar(até as melheres, de saia...), má ninguém dava fêt'aquile.
    Atã n'é qu'é cá reconheci o mestr'Albane no retrate e com'era magrinhe ...O má gordinhe, tamém nã m'é estranhe, má nã dô deslindade quem é. O meceque tamém dá no jête e é engraçadeque, má nã no conhece, pôs esta gente nova é cá já nã atine com eles.
    Parente, peço desculpa de caquenhar tante, má se s'aborrecer nã lêa e desculpe-me.

    Passe bem


    O Campaniço

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  3. Olá, querido Parente! Não se esqueça do Setembro e suas cores mai-las vindimas (adoro Lagoa!)... A terra parece preparar-se para sonhar e descansar até à Primavera, o sol é mais oblíquo e dourado ...aí pelas serra deve ser um encanto! Fico à espera das suas reportagens. Abç

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  4. Qu'é fête de si, ti'Refoias?
    Há já muntos dias qu'ê cá venhe esprêtar se vocemecêa pôs aqui mais palavreado e fotografias novas, e nã dou achado nada de novo! Espero que estêja tude rije consigue.
    Bem sei que a minha tentativa de imitar a pronúncia monchiqueira não teve muito sucesso :P

    Venho aqui dizer-lhe que já iniciei um pequeníssimo fotoblog, e que a sua visita será bem-vinda.

    Vá dando notícias!

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  5. http://www.fotolog.com/secondsun

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  6. Força com esses encontros!
    Antes que se acabem os foles
    Abr
    Pedro

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Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"