Ó ê cá m' engano munto ó atão nã há campo de bola nenhum com uma vista destas...
Daquela vez qu' ê cá andí a devassar ali a r'tunda do Descansa-Pernas, tã penas o ti Vergil Patinha abalô com o Carôcho dele, dé-me uma gavierra e inda voltí p'a trás, caminho do campo da bola.
Nã é qu' ê intenda lá grande coisa daquilo - p'a d'zer a verdade, nã percebo é coisíss'ma nenhuma - mái, lá de q'ondo im vez, calhando a minha Maria a nã 'tar a ver o romãinço na tel'visão e eles darem um jogo de bola, ponho-me a olhar e gosto de ver aquilo.
O campo, verde que nem um cantêro todo sameado de trigo, q'ondo ele inda 'tá assim bem rastêro, uma preçanada deles a fugir atrás da bola, três, tôd's vestidos de preto - um com um birlo na boca e dôs com uma bandêralha na mão - e aquela famila toda a fazer um lanedo que mete medo e a ch'mar nomes uns ôs ôtr's - más ôs de preto qu' ôs ôtr's. Tem que se l'e diga...
E q'ondo os que jogam dã aqueles pinotes no ar e batem um bate-cu no chão que dã voltas até mái não?... Isso é qu' ê cá encho o papinho a rir... É qu' os marafados têm cá uma manha tã grande ó tã pequena qu' acabam de cair um malhão, ficam p' ali tôd's ratorcidos no chão, béque-me quái a morrer, e, daquem nada, já 'tã ôtra vez d'em pé, tôd's limpêros, c'm' se nã t'vessem caído.
Pôs, cheguí lá, meti p'r aquela v'reda abaxo que 'tá em par do hospital, desatí a tirar retratos. D'zer a verdade, aquilo dá-se logo com o campo e tem umas vistas do melhor que pode ser e haver. Quem s' alembrô d' o fazer ali nã teve má idéa, nã senhora. S' a famila nã 'tar a gostar do jogo, olha p' às vistas que nã fica mal servido...
'Tá bem que s' haver p' ali algum qu' atanche um pontapé na bola, assim mái a precêto, o menes qu' a têm d' ir b'scar é lá p'ra baxo p' à R'bêra do Ambróizo, mái aquilo o jogo usa a ser ô D'mingo à tarde e a famila cá im Monchique, nesse dia, tamém tem vagar com fartura...
Calhando, c'm' nã davam fêto bancadas, cortaram duas sobrêras e fazeram dôs bancos p' à gente s' assantar...
Nisto, 'tava ê cá munto bem intretido a olhar p' àquilo tudo, já mái a ver os cerros além p' ô lado do Alferce qu' a olhar p' ô campo da bola, oiço um remôrzinho p' trás, volt'-me, quem é qu' havera de ser?... Um amigo qu' ê já nã via há bem munto tempo: O ti Alvino das Martunhêras.
O homem, uma ocasião, vendé-me um presunto, e bom qu' ele 'tava, foi foi um coisinho carote. Mái atã ê 'tava desgovernado e tinha precisão p'a convindar uns amigos... Mái lá qu' ele 'tava bem arrenjadinho, méme ali na conta, nem munto salgado nem munta g'rdura, uma coisa c'm' deve de ser, lá isso 'tava.
Pôs, o ti Alvino vinha ali prêabaxo, p'r aquela estrada que faz d' encurtadoiro désna da curva do hospital, adonde 'tã aqueles gradessíss'môs calitros, até ô Descança-Pernas. Mái c'm' ele anda assim com aquele passinho lento e vinha calado que nem um rato, se nã é dar uma topada num torrão que 'tava ali no mê da estrada, bem que chigava ô pé de mim e ê cá nã dava por ela, qu' era o qu' ele se 'tava a preparar. P'a me meter um medo.
- Eh, ti Alvino!... Atã vinha aí e nã d'zia nada?!...
- Ah, marafado, qu'ria-te fazer a parte, mái incalhí aqui neste torrão, nã dí chigado ô pé de ti sem dares p'r mim... Dés te dê saúde, Refóias.
- Venha com Dés, ti Alvino. Ai queria-se meter com-migo...
- Atã, o qu' é que fazes aqui, môç'?
- Olhe, 'tô a atirar uns retratos ô campo da bola e f'quí emprensado com esta linda vista que se vê daqui. É que vê-se tudo désna d' além da Picota, p'r esses cerros fora até já munto p'ra lá do Alferce. Aquilo, além ô longe, já há-de ser S. Marc's ó coisa assim...
- Nã tem nada im ser... Calhando, é... Atã, mái tu tamém sofres da bola? P'a 'tares aqui com um empenho desses...
- Nã senhora... Ê, p'a ser franco, inda nunca tinha aqui vindo ô pé, só conheço isto de ver ali de cimba, da estrada, e só vejo bola se dar na tel'visão. E isso, s' a minha Maria nã 'tar p'a lá a ver o r'mãinço...
A relva é de plástico. E p'r o que diz na carrinha a Cam'bra dá apoio.
- E uma coisa te prècuro ê cá. Atã e eles nã fazeram aí uns lugarinhos p' à famila s' assantar?
- Nã vê que não?!... Tamém a grande fartura deles qu' hã-de 'par'cer aqui... Mái semp'e dava melhor jêto 'tarem santados que d' impé, lá nisso, dô-l'e r'zão.
- Dizes tu que vêm pôc's? Atã, já descobri o gato... Nã vês estas duas sobrêras qu' eles cortaram aqui? Foi p'a fazerem os bancos p' à famila s' assantar...
- Quem sabe lá... Os que nã caberem ficam d' em pé... Mái dêxando de rir p'a mangar, que jêto terem corto as duas sobrêralhas? Atã isto faziam assim tanto mal aqui?...
- Podiam dêxar cair as lãindas além p'a drento do campo e os homens inda descorregavam im cimba delas. Lá p'r mode a folha nã havera de ser qu' aquilo até que dá uma cama do melhor que há p' ô gado...
- Olhe, ê carreguí muntos costales delas p' à p'cilga dos mês... Agora é que já nã há quem faça tal serviço. Ninguém tem míngua de fazer monturo p'a arrenjar esterco...
- Mái semp'e gostava de saber s' as sobrêras 'tavam perdidas ó se foi coisa de pedirem l'cença p' às cortar.
- Perdidas?!... Com uns tróços assim cernes c'm' estes inda aqui 'tão?!... Pode ser que sim, nã digo que não, que nã m' alembro delas entes, mái béque-me nã l' acho jêto nenhum disso.
- Mái, p'r falar nas lãindas cairem ali p' ô campo, já viu aquela linda relva qu' ali 'tá, com uma cor qu' é um encanto e chêa de força? Vê-se mémo que l'e têm posto um belo amòin'zinho e água nã l'e tem faltado...
- Ó Refóias, nã digas uma patochada dessas, que te oiçam, ó inda te chamam parvo... Nã vês qu' aquilo é tudo de plástico?!...
- O quem?!... De plástico?!... Mecêa é que 'tá a qu'rer fazer de mim parvo...
- Ai nã acraditas... Atã anda lá daí e vamos devassar aquilo bem além ô pé.
E abalamos. Aquilo foi só o tempo de se dar chigado lá ô pé, encostí-me à rés da rede, assomí-me p'r um buraquinho e arregalí os olhos. Atã nã era qu' o ti Alvino 'tava chê de r'zão... Aquilo era méme de plástico, home!...
- Já vale a pena!... Ê cá, fêto alarve, cudando qu' isto era erva, ô fim de contas sai-me plástico... Atã e isto presta?
- Des que sim. Des qu' é o que 'tá na moda...
- Com tanto sol, água e terra boa que se tem aqui im Monchique e põem-me ali uma coisa im plástico p' ôs moç's jogarem à bola im riba... E quem é que pagô isto?
- Sê cá!... Há-de ter sido o Clube da Bola... Ê cá nã fui, disso 'tejas certo...
- Certo é qu' ê cá nã 'tô de nã ter sido vomecêa e eu e ôtr's c'm' à gente... Nã sabe q'onto é que tem p'ra pagar, agora no mês d' Abril, da déc'ma da su casinha e dos sês cantêralhos?
- Já me chigô lá uma carta p'a pagar a pr'mêra pagela, sim...
- Pôs, se nã sabe fique sabendo qu' isso é d'nhêrinho que vai tôd' p' à Cam'bra... E olhe lá o que diz ali na carrinha...
O homem lá soletrô devagarinho - qu' ele vê mal e só andô na escola-paga pôco mái de sês meses - e f'cô-se, assim, béque-me, imbosnado.
- Atã, nã diz nada?
Olhô p'r a mim, olhô pr' à carrinha, dé voltas ô miolo e lá se resolveu:
- Atã, M'nicip'o é a Cam'bra?
- Pôs é!...
Salta, munto l'gêro:
- Pronto. Já 'tá tudo visto. O Clube da Bola é deles. E os homens têm qu' olhar p'r isto...
- Nã é nada deles, ti Alvino... E inda bem que nã é, senã inda era pior...
Bom, o que se falô a seguir nã l'es conto aqui. Qu' a gente nã sabe bem c'm' é qu' as coisas se passam e p' a se d'zer parvoêras é melhor se 'tar calados. Mái isto anda bem munto ruim aí p'r tôd' ô lado, que nã falam senã im clubes da bola e cam'bras e presidentes e apitos doirados e coisas assim...
'Tá bom de ver qu' isto aqui im Monchique nã há-de ser nada c'm' nôtras bandas. O Clube da Bola, calhando, é bem munto rico e nem tem precisão nenhuma do d'nhêrinho do M'nicip'o. E méme que t'vesse...
Saúde da boa, mês belos amigos!...
Compadre refoias
ResponderEliminarVocê devia era escrever um livro a contar a sua vida, porque tem muitas histórias engraçadas. Essa escrita é igualzinha ao do meu falecido bisavô que Deus tem.
Vejo que o compadre tem fraca instrução, pois nota-se perfeitamente bem, em como o compadre faz um esforço danado, para nos transmitir as suas desditas. Mas não se preocupe, porque eu também era assim, não sabia escrever, nem ler muito bem, mas com o tempo habituei-me. É só uma questão de lhe apanhar o jeito. Mas não se rale, que eu também me habituei a ler as cartas da minha namorada, quando eu estava na tropa e olhe que ela, escrevia só um coisinho melhor que o compadre. Bem mas eu compreendi muito bem o que vossemecê nos quis dizer. Olhe que eu não sou parvo. Não demore muito tempo a escrever outra vez, porque eu já estava a ficar preocupado, com a sua falta de correspondência.
Um abraço até à próxima.
Caro amigo, como amante de desporto sinto que deve ser de um enorme prazer jogar num campo como este, rodeado de ar puro e com uma linda vista. Cumprimentos
ResponderEliminarAmigo Zé do Corgo
ResponderEliminarConcordo consigo amigo Zé do Corgo. Você acha que não é parvo e eu acho que também não sou nada parvo. Nota-se mesmo muito bem que o compadre faz um esforço muito grande para escrever um pouco melhor do que a sua instrução lhe permite. Ele bem que tenta libertar-se desse modo de falar das gentes serrenhas de Monchique e usar uns termos mais eruditos. Mas não tem culpa. Está de parabéns pelo esforço. Mas olhe eu deixo aqui uma sugestão; eu e você, caro amigo Zé do Corgo, que como se nota somos bastante mais instruídos do que o compadre refoias poderíamos ficar disponíveis para traduzir essa linguagem serrenha para um linguagem mais moderna, uma linguagem que possa ser compreendida pelas pessoas mais novas, com mais estudos. É que como acha o amigo Zé e também eu (que somos ambos espertos), o compadre conta muito bem as histórias mas complica tudo por não saber escrever melhor sem usar esses termos populares, em desuso. Mas olhe amigo Zé temos que desculpar o compadre porque eu conheço-o bem e sei que ele praticamente nunca saiu da Refoias, penso que nem tem a 3ª classe de adultos e já agora, eu que não sou parvo, estou convencido que ele simplesmente não é das pessoas mais cultas, mais inteligentes e possuidoras de um das sensibilidades mais refinadas da nossa terra e arredores.
Essa do livro vai ter que ser. É uma obrigação moral que o compadre tem.
Cumprimentos atlânticos,
HeR
Olá Parente
ResponderEliminarAntes de mais os meus melhores cumprimentos aqui do Porto e votos que passe um belo Domingo de Ramos.
O que venho perguntar é se aqui nao ficava o heliporto?
E já agora outra coisa se faz o favor. Para ir para o Barranco de Pisões toma-se primeiro uma estrada que tem as indicações Foz do Farelo / Selão / Chilrão. São estas as indicações? Mudaram a placa?
Muito obrigada
Amigo Zé do Corgo
ResponderEliminarMecêa tem toda a r'zão. Se sabesse os trabalhos qu' ê passo p'a escrever mêa-dúiza de coisas, logo via...
Olhe qu' o sê bisavó, calhando, era pôco mái velho do qu' ê cá e, olhando ô b'sneto, havera de ser um amigo do melhor.
Fico munto sast'fêto de saber que vomecêa, méme ê cá escrevendo mal c'm' tudo, percebe-me, mái ó menes.
Passe munto bem.
Mê bel' amigo HeR
ResponderEliminarMecêa e o Zé do Corgo tiraram p'a mangar com-migo... Ah, moç's marafados!...
Pôs olhe qu' im vez de f'car infèzado, fico até muntíss'mo sast'fêto de pessoas tã emportantes c'm' vomecêa inda se darem ô trabalho de ler isto e meterem-se com-migo.
Munto l' agradêço 'tar assim d'spôsto a dexplicar as minhas patochadas p' à famila d' agora. E tenho a firme certeza que nã dava incontrado quem fazesse isso melhor qu' o mê belo amigo, que des que estudô no estrangêro uma preçanada d' anos e, hoje im dia, tamém hôve quem me d'zesse que já é um dos professores mái emportantes aí na su' universidade.
Vomecêa estudô munto e é um homem qu’ ê cá, parvo c’m’ sô, nem sê encarecer o valor que tem.
Mái uma coisa l’ e digo: Nunca se desquecé do qu' aprendé nos cerros da Portela Baxa e na estrada dos Casá's c’m’, p’r exempes, q'ondo panhava aquelas gradessíss'mas molhaduras a cavalo na su b'cicleta a m'tôr, chigava pingando ô colégio ó ô liceu e tinha que enxugar a rôpinha toda no corpinho.
É de famila assim qu’ ê cá gosto.
Tenha munta saúde e Dês l’e pague.
Minha bela amiga Manelinha
ResponderEliminarDés l'e dê tamém um D'mingo se Ramos do melhor.
O heliporto é um coisinho mái atrás. Este campo da bola é méme im frente do hospital, da bandinha de baxo. Alembra-se daqueles calitros munto grandes, ali na curva do hospital, que mecêa, uma vez, falô? O campo da bola é quái à rés deles.
Com respêto à estrada p' ô Barranco dos Pisõs, é essa que mecêa diz. Logo pralàzinho do heliporto, fazeram uma r'tunda nova (a do Descansa-Pernas). Nessa r'tunda volta à esquerda, p'ra cimba, e, despôs de ver o Barranco dos Pisõs, vá p'r estrada do Chilrão e Pé do Frio, sempre em frente, que vai dar à estrada de Marmelete. É um passêo do melhor que pode haver.
Se ter míngua, veja este desenho já antigo http://refoista.blogspot.com/2006/06/recantos-da-vila-fonte-da-mata-porcas_07.html#links.
Se 'tá im Monchique ó vem cá, ad'virta-se munto e faça boa viaja.
Até um dia destes.