15 maio 2007

Flores do Maio: Adelfas e Rosas-Albardêras

Adelfeira - Monchique
As adelfas, os fôg's bem nas quem-maram, más elas aí 'tã ôtra vez...

Na Fóia, há p'r 'í bem muntas flores que já quái que nã há im banda nenhuma. Ontordia, qu' isto é Maio, tirí p'a ir dar uma volta à prègunta dumas q'ontas, que sã as qu' ê cá mái aprecêio. E dí com elas todas. Mái, agora, só l'es vô amostrar duas, que sã as qu' ê mái me revejo nelas.

Olhem, a pr'mêra é a adelfa.

Há quem l'e chame ôtr's nomes assim um coisinho manhôsos, c'm' asália, rododendro, loendro e ôtros que nem l'es sê d'zer, más isso é a famila que estuda munto e lê esses nomes nos livros. A gente aqui semp'e l'e ch'mô adelfa e há-de ser semp'e adelfa.

E olhem qu' é uma flor tã emportante que nem tampôco se pode panhar, qu' é pr'ivido. D'zer a verdade, p'a se dar com ela é preciso um homem saber adonde ela há, e é im pôc's sitos, tamém l'es digo. Más a más, que, q'ondo hôve os fôg's, nã sê se f'cô alguma que nã tenha ardido. P'r menes, as qu' ê cá conhecia f'cô tudo chamuscado.

Flor da adelfa - Monchique
Em bonito, pode haver igual, mái melhor nem pensar...

E é uma coisa qu' ê repaìrí é qu' elas, méme já 'tando todas bonitas ôtra vez, inda se l'e vê os paus velhos tôd's fêtos im cravão. E dá dó...

Máicudem, q'ondo ê vi a Serra arder assim toda daquela manêra, semp'e pensí que adelfas, rosas-albardêras, gilbrabêros, azevinhos e coisas dessas haveram de ser má de voltar a par'cer ôtra vez. Más inganí-me e 'tô sast'fêto de me ter inganado. Quái tôd's já têm arrebentos que, vistos ô longe, nem dã ares a ter ardido.

P'r mode isso, já ê tive umas temas com o mê parente Zé Caçapo, qu' a gente os dôs, más um nada, inda se tínhamos más era p' ali zangado um com o ôtro. O homem nã basta ser gozão, senã inda ser tem-moso que nem um burro. E meté na cabeça qu' umas adelfêras que toda a vida tenho conhecido ali num sito qu' ê cá sê, nunca tinham ardido.

Ora ê sê muntíss'mo de bem qu' elas arderam... Criaram foi logo uns belos arrebentos e quem nã as vai ver bem lá ô perto, cuda qu' elas nã arderam. Ai nã arderam... Era bom que nã t'vessem ardido, mái arderam, sa senhora.

- Ó Refóias, tu 'tarás parvo?!... Atã ê cá é que sô velho e tu é que atribóes assim as coisas... Nã vês qu' o fogo passô além de roda e saltô p' às mongariças da banda de cimba que nem tocô nas adelfas?!...

Flor da adelfa - Monchique
Estas flores sã c'm' algumas m'lheres. Q'onto mái bonitas, mái excamungadas... do veneno que têm.

- Ai nã tocô nas adelfas... Quem-mô-as foi todas!... Elas é que já deram ôtra vez arrebentos...

- Qual o quem!... Atã c'm' é qu' elas se faziam daquele tamanho im menes de nada?... Aquilo é uma coisa que leva munto tempo a crecer... nã é dum ano pr' ô ôtro.

- Ó t' Zé, atã mecêa nã vê àlém aqueles tanchôtos a saírem assim da ramaja, que tã tôd's pretos, fêtos im cravão?...

- Que jêto?!... O qu' ê vejo àlém é uma preçã de ramaja toda chêa de viço e umas florzalhas já im mê abrir... Agora tanchôtos quem-mados... Alguma vez?!...

Inda l'e quis fazer ver qu' aquilo tinham crecido daquela manêra p'r mode 'tarem num sito méme ô queres p'ra elas - fresco, voltadas ô norte, numa chanita de terra bem negra, ô ladinho dum córgo, pequeno mái que nunca falta lá água - mái nã servi de nada. E ele semp'e a l'e dar:

- Inda tens munto que patear p'a aprenderes a quarta parte do qu' aqui o tê parente sabe... Má', em qu'rendes, chega-te cá p' ô de mim qu' ê dô-te umas liçõs...

Ah, velho dum raio!... Bem que l'e puseram o alexim de "Verruma", qu' ele 'tá semp'e a judear. É que, mém' ê cá nã qu'rendo, já me 'tava a fazer chigar o sãingue às ventas, qu' era o fito dele, p'a me ver bem inzàinado.

- Olhe lá, venha lá daí e vai-se àlém ô pé tirar temas... Que vomecêa há-de ver que nã tem coisíssema nenhuma de r'zão!...

- Ê cá?!... Ir agora aí labuçar as calças todas nos tróços quem-mados dos tojos e inda m' afiturar a atascar as botas naquele lamatêro qu' a água que salta da córga faz àlém méme à rés das adelfas... Isso é qu' era bom!... Vai tu sòzinho, se qu'reres...

- Ah... os tojos arderam, más as adelfas não... Tal é essa patochada... Já foi panhado. 'Tá a ver c'm' o fogo semp'e quem-mô isto aqui tudo?...

Más ele, vi-se pertado, desatô logo a desconversar e mudô d' assunto.

- Olha lá, já viste bem aquelas rosas-albardêras c'm' 'tã bonitas?...

Rosa-albardeira - Monchique
A rosa-albardêra tamém só há im certos sitos, mái bonita é ela...

- Ah, já nã l'e calha a conversa, vira-se p' às rosas-albardêras...

- Sim, atã aquilo é qu' é uma flor do mái bonito que pode ser e haver... E nã l'e mexas munto qu' elas tamém sã venenosas e nã se podem panhar que tamém é pr'ivido.

- Há que tempos qu' ê cá sê disso... Inda era moço-pequeno, já ê 'tava farto de saber tal coisa... Ó pensa que nã tive munto quem m' insinasse?...

- Isso dizes tu. Calhando, 'tás a saber agora...

Lá 'tava o estapôr do "Verruma", ôtra vez, a qu'rer empencer com-migo... É qu' o marafadoesperdiça ocasião nenhuma...

- Olhe, se vomecêa nã t'vesse quái idade p'a ser mê pai e, inda p'ra más, é mê parente, ê já l'e d'zia... Punhana, que nã pode passar sem 'tar sempre pegando com uma pessoa...

- Olha... Tu é que 'tás p' aí béque-me com os azêtes que nã se pode d'zer nada. Mái nã t' inzáines que, méme nã sabendes nada destas coisas, ê sô tê amigo e tenho pacência p'a t' insinar, e daí, inda sô homem munto bem capaz p'a pagar uns calcesinhos aí numa venda qualquer...

Aí, já f'quí um coisinho mái de boa avêa.

- Vá lá que lá disse uma com jêto... Agarrado c'm' vomecêa é, quái que nem quero crer numa franqueza dessas assim sem mái nem quem...

- Se nã t' apetêce, fica p'ra ôtro dia. Com bebida nã se perta...

Responde ele logo, munto l'gêro, calhando, já repeso de se ter descaído...

Rosa-albardeira - Monchique
Mal empregado ser uma flor que tamém já se vê munto pôco cá p'r estas bandas...

- Que jêto nã m' apetecer?!... Acha qu' ê tenho cara de l'e fazer uma ofensa dessas?... Mecêa com uma ãinsa tã grande de pagar qualquer coisa e ê cá nã acêtava?... Ê sô sê amigo, parente...

Respondi-l'e ê cá, inda mái l'gêro, nã fosse ele voltar atrás...

- Mái vê lá se nã te calha, fica p' ôtro dia... Podes ter p' aí que fazer... ó coisa assim...

Isso queria ele qu' ê cá nã acêtasse... Abalô-se e teve que pagar, que se charingô... Tamém nã l'e fica fazendo falta nenhuma. O homem é sòzinho, nã tem filho nem filha, arrecebe uma bela pensanita, coisa duns cinquenta contos, perto ó certo, e come lá das coisas que samêa nos cantêros dele, nã se pode quêxar munto...

Ê bem no tenho visto, d' ora im q'onto, ir caminho ali da Caxa, munto d'sfarçado, com um saco de plástico nas mãs, todo inrolado. Aquilo é o que l'e sobra tôd's meses qu' ele vai lá pôr a render. Nã é senã isso...

Pôs olhem, o ti Zé Caçapo, nesse dia, até me fez f'car abismado. O homem é má de se descoser, mái em ela l'e chigando à cabeça, béque-me fica logo ôtro, manda vir rodadas às duas e três d' enfiada. E nã pagava só pr' ôs dôs, nã cudem. Era p'a q'ontos lá tavam naquela venda...

Só l'es sê d'zer que já era ê cá que me qu'ria pôr a andar e ele que nunca mái arrencava de lá... 'Té a minha Maria havera de 'tar já im cudados d' ê nã par'cer e o decomer a arrefecer...

Rosa-albardeira - Monchique
Méme desfolhada, a rosa-albardêra inda é uma lindeza...

Mái voltando às adelfas e às rosas-albardêras, se calharem a dar com alguma, aprecêem-na bem mái nã l'e façam mal nem pensem em levá-la p' ô jardim, se t'verem.

Logo, qu' é pr'ivido panhá-las que 'tã quái a d'spar'cer todas. Despôs, qu' elas sã venenosas e podem-l'e fazer a parte. E, inda p'ra más, elas nã se dão senã nos sitos qu' elas gostam e, atão, nã pegam.

Passem munto bem e até à vista.

9 comentários:

  1. Lindas, lindas!
    Até fiquei com vontade de ir até à Serra só para ve-las!
    Obrigado pela partilha.

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  2. Ah…grande parente!
    Como você, ama a natureza!
    Se todos tivessem a mesma grandiosidade de alma, talvez o mundo, tivesse que enfrentar menos problemas. Quem ama a natureza, com todo esse carinho, também ama muito de si mesmo.

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  3. Meu caro amigo Parente

    Como lhe invejo a sorte de ainda poder desfrutar da beleza das rosas de albardeira que, aqui por terras de Idanha, eram tão abundantes nos montados e agora apenas se encontram esporadicamente.
    Em Toulões, pelo simbolismo que carregavam, eram consideradas as rainhas das flores.

    Um abraço aqui da raia

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  4. Quase sinto o cheiro, só de ver tão belas fotografias... Quando a confusão do dia a dia aumenta, aumentam também as saudades da terra/serra...
    Cumprimentos a si e à sua Maria

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  5. Viva,

    As adelfas sobreviveram à última glaciação e, ainda mais extraordinário, à destruição humana...são um milagre da Natureza e um dos muitos, talvez até o principal, motivo de interesse da flora de Monchique (uma flora já de si cheia de grandes motivos de interesse dada a mistura de influências)...

    Enchem-nos os dias de alegria...fiz-lhes uma referência na sombra verde.

    Abraço

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  6. Ai, quem me dera poder apreciar ao vivo essas lindas flores...
    Não consigo deixar de invejar o virtuosismo da sua máquina fotográfica ;)

    Cumprimento para si e para a sua Maria.

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  8. Obrigada amigos por este cheirinho da nossa terra, para quem está longe significa muita coisa..beijinhos Vera Ferreira

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Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"