01 junho 2006

Recantos da Vila: A Fonte da Caraça

Fonte da Caraça

Que belo torno d' água que dêta a bica da Fonte da Caraça

Ali p' ô Pomar Velho, quái no caminho da magnólia, 'tá ôt'a fonte que dêta um torno d' água qu' é um consolo. Com a água que tem e no sito adonde fica, s' a Junta de Freguesia a arrenjasse f'cava uma coisa linda...

Méme assim, ô dés dará, ela é bonita e vê-se qu' a famila d' ali d' ô pé despuseram lá umas florinhas e ôlham p'r elas. Mái qu' aquilo murcía uma coisa melhor, essa ninguém me tira. E já levando em conta qu' a água nã 'tá capaz p'a bober... Qu' isso é ôtr' caso que dá munto que pensar.

Q'ond' ê era moço-pequeno, p'r tôd' ô lado havia fontes nesta serra e a água era boa. A gente bebia até naquelas córgas que gemiam água tôd' ô ano e f'cavam assim mái desviadas . Era toda boa...

Despôs, puseram-se p' aí a despôr calitros - alguns, até nos cantêros, fazeram esse trabalho - uma àmetade ó más das nascentes secaram-se, os barrancos, grande parte deles, acontecé-l'e o mémo. Más a qu' havia inda era capaz p'a se b'ber...

Daí em diante, par'ceram os porcos brancos, aí é que deram cabo do resto... Tôd' ô bicho-careto tinha uma malhada de porcos, despejavam a porcaria deles fosse p'a donde fosse, ia tudo parar ôs barrancos e às rebêras.

Más, entes, parte daquela nata ia-se metendo na terra até que chigô ôs nascentes. E pronto. Agora 'tá a Fonte da Caraça naquele estado. Nã vêem aquela chapa azul pregada na pedra a d'zer qu' a água nã presta?!...

Mái, se fosse só aquela, inda vá que nã vá. O pior é que 'tá quái tudo assim. Vai-se à estrada do Alferce é o mémo, à estrada da Fóia igual, à estrada de Marmelete nem se fala...

Isto até custa meter cá na cachimóina. Atão uma terra com uma água tã boa que nã conheço adonde possa haver igual e já nã se pode b'ber uma sede d' água quái em banda nenhuma, que 'tá toda ruim?!...

Olhem, logo preciminho da Fonte da Caraça 'tá ôtra, e essa, c'm' nã é da Câmb'ra, já nã tem chapa nenhuma. Sará que nessa, desviada p' aí uns cinquenta ó cem metros, já se pode b'ber? Calhando, não. Ê cá, nã m' afituro a isso qu' ê tenho medo de panhar algumas febres e inda ser obrigado a ir ô dôtor...

Qu' ela é bem fresquinha e até apetêce, é verdade, mái vá lá uma pessoa se descudar e despôs ver-se em traquetes... A minha Maria tem munto cudado com coisas dessas.

Des qu' uma ocasião, em pequenalha, b'beu uma água ruim dum rego que passava lá à rés da casa da avó dela, teve umas febres tã grandes ó tã pequenas que 'tava na cama e só via tudo a arder. Contô-me ela que, dessa vez, se vi' bem empeçada.

Ora se já se teve uma água do melhor que pode ser e haver e hoje nã se tem, há-de haver alguma r'zão p'a isso. Ê cudo que sê qual é, mái os engenhêros e dôtores é que conhêcem disso e haveram de ter já fêto seja o que for p'a ver s' isto melhora.

Bem se tem ôvido falar em fossas, numa estação de tratamento e tal e tal... Nã se vê é nada fêto. E os m'lhêros de porcos qu' há aí p'r tôd' ô lado, tôd's dias, a estrumarem e a porcaria deles a dar cabo da nossa bela àgu-inha.

E fic'-me p'r 'qui. Vamos a ver s' inda chigará um dia que se bobido água nas fontes todas sem cagufa de panhar as tás febres.

Dés l'es dê saúde.

2 comentários:

  1. Ainda bem que existe quem inventarie os recantos pitorescos da nossa serra; desconhecia a existência da singela fonte da Caraça, mas registo-a desde já no roteiro das minhas próximas férias em Monchique (como apertam as suadades), e que o seu alerta sobre os problemas nos recursos hídricos do concelho sirva para que algo seja feito na defesa daquele bem tão precioso!

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  2. Ai os termos: calitros, corgos, os moços-pequenos...
    Moça-pequena ia eu à escola da Rua Nova, à catequese a Marmelete, à mercearia à Boavista, ou ao Corgo do Vale.
    Ainda hoje, vou à Fóia, aos Casais, às Caldas, ao Pé da Cruz, comprar chouriços daqueles bons...ou à feira dos enchidos, ou ao mel do bom...
    Saí criança de Monchique mas, minha terra e meu sotaque são sempre aí e daí!

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