14 setembro 2007

Caminho de Santiago - A Pedra Furada

A Pedra Furada
A caminho de Barcelos, passa-se num sito qu' é a Pedra Furada...

Ontordia, contí a parte da Pedra Furada ô mê compad'e Jôquim do Barranco, andava a gente a ver p' ali umas Ol'vêras dele, das galegas - e, d'zer a verdade, elas nã 'tavam assim munto mal de zêtonas, precisavam era que chovesse uma gotinha d' água p'a elas engradarem.

Pôs, o marafado foi pr'a casa e contô-a à m'lher - a c'mad'e C'stóida. Ela, p'a nã s' inganar, falô nisso à minha Maria. Ora, a minha Maria, f'cô logo de rabo alçado com-migo p'r mode ê nã l'e ter falado já no caso a ela.

Des qu' ê cá, lá p'r fora, conto a minha vida, de fio a pavio, sem tirar nem pôr, e cá im casa, com ela, nã aibro pio. E, despôs, é logo desconfiada que nem o diacho e vá d' em-maginar, sê cá o quem, a mê respêto...

- O qu' é que se taria passado lá nesse tal sito da Pedra Furada p'a tu nã me d'zeres nada?... Ô compad'e Jôquim, sabeste tu contar logo tudo, más a mim nã me d'zeste nada...

- Ó m'lher, isso foi qu' inda nã tive ocasião. Aquilo dé-se tanta coisa, tanta coisa, naquelas dias tôd's que p'r lá andí, que nem im toda a vida e mái sês meses ê dô contado tudo... Umas que nã há tempo que chegue e ôtras qu' ê, tamém, nã m' alembro de tudo, assim de mimento.

- Más essa delas passarem lá p'r o buraco da pedra, béque-me, tem más que se l'e diga...

- Nã senhora!... Aquilo é uma coisa ingraçada que p'a lá uns inventaram, com respêto às m'lheres que serem capazes d' infiar p'r o buraco da pedra e passarem p' ô lado de lá.

- Atã, conta-me lá isso bem qu' ê cá quero saber c'm' é qu' a coisa foi... E nã dêxes nada p'a trás!...

A Pedra Furada
Tal acham esta hab'lidade? Inda é preciso ter coraja...

- Ó m'lher, aquilo nã tem nada de mal. É só uma brincadêra. Mái p'a fazer galhofa que ôtra coisa...

- Nã sê lá munto bem...

- Atã, nã vês, lá num certo sito adonde a gente passa, puseram um gradessíss'm' ô baloiso com um buraco na parte de cima. Uma coisa assim com uma largura que, mái ó menes, dê p'a passar os ombros e os quartos duma pessoa, méme que pertados.

- Atã, e se uma ser assim mái forte e nã dar passado as nalgas?...

- Nã se meta lá... 'Tá bom de ver... Más a más qu' aquilo tamém é preciso ter uma certa ginásquita...

- E as m'lheres vai tudo lá?...

- Olha, as qu' ê cá vi, foram todas. Cheguí lá, d'zer a verdade, já bem munto impeçado - com a molhadura inda im mê secar e os pés já nã os sintia - e, atão, apr'vêtí p'a sossegar um coisinho.

- E as qu' iam contigo?...

- Ó Maria, com-migo nã ia denhuma... Ê chigava, quái sempre, à últ'ma. Atã já nã t' alembras c'm' ê cá levava a perna?!...

- Ê sê cá se tu ias coxo ó s' aquilo era conversa tua... P'a veres tudo o que se passava com elas, já nã ias coxo, não!...

- Lá 'tás tu... Ia, sim!... Isto é tã puro c'm' à luz que nos alumêa!... Q'ondo lá chiguí, já elas 'tavam fêtinhas p' à brincadêra da pedra... Aquilo foi um 'stante, desataram todas a infiar p'r um lado e sair p'r o ôtro...

- Mái que raio de brincadêra é essa?...

A Pedra Furada
Méme cansadas e sabendo c'm' às coisas são, nã há nenhuma que nã se meta lá...

- Olha, ê prècurí lá o perquem das m'lheres fazerem aquilo e a r'posta que me deram foi que aquela pedra conhêce lá umas certas coisas a respêto de qualquer m'lher. Sabe s' a m'lher já foi... - c'm' é qu' ê cá t' hê-de d'zer isto... - se já teve... se anda sovada d' algum homem... Comprendes?...

- Ah, s'inda é virge ó não...

- Isso mémo!... E, calhando a ser, narce-l'e um môce-pequeno logo a seguir. É c'm' à pedra dá a intender a condição da m'lher que lá passa.

- E se nã ser?...

- Aí, nã narce môce-pequeno nenhum... Qu' é o que se dá com todas as que fazem a exp'r'mentação. P'r o jêto, inda nã hôve a pr'mêra que t'vesse tido esse tal môce-pequeno, logo ali...

- Atã, isso, é uma vergonha p' às que nã sã casadas... Ah, ê cá, se fosse soltêra, lá é que nã me metia... Nem pensar!...

- Nã te metias agora... Passavas lá tal e qual c'm' às ôtras...

- Que jêto?!... E s' a pedra s' inganasse?!... Tal era a rabana qu' ê panhava!... Nã, nã... Ê cã, im nova, nã ia nisso, nã cudes...

- P'a qu' é tu seres assim com'chosa dessa manêra? Aquilo é tudo p'a levar na ratoiça, Maria. Nã quêras crer nessa coisas...

- Atã, e com respêto ôs homens... tamém fazem alguma coisa?

A Pedra Furada
Há quem nã l'e custe nada fazer tal serviço...

- Qu' ê cá saiba, nã l'es pertence fazer nada, mái, se passarem lá, que mal é que l'es pode fazer?...

- Ora, essa dita pedra tamém podia d'zer quasequer coisa a respêto de vocêas...

- Beh!... O qu' é qu' ela podia d'zer, mom?!...

- Ora... Ê nã digo que tenho vergonha, mái, calhando, f'cava-se a saber munto. D’ alguns...

- Vê lá p' aí bem isso, olha qu' ê tamém exp'r'mentí a meter lá a galga...

- E a pedra nã falô?

- Pôs não... O qu' é qu' ela havera de d'zer?...

- Ora aí 'tá!... S' ela nã falô, alguma coisa t' incontrô. Boa nã foi ela...

- Nã, m'lher... Ê só m' assomí lá p'r o buraco, mái nã foi p'r nada. E, entes, disse logo que fazia aquilo im lugar da minha Maria. De manêras que, se nã se passô nada, foi com respêto a ti...

- Olá!...

- Sim... E, inda tem más ôtra. Ê, despôs, só passí dum lado p' ô ôtro p'r mode uma coisa. É que já tinha os braços da banda da frente e, de manêra nenhuma, os dava posto, ôtra vez, p'a trás...

- Munto gostava ê cá de ser uma mosquinha e ter lá 'tado p'a ver bem isso tudo munto bem visto...

- Olha, com a galhofa qu' elas p'a lá fazeram, foi uma barrigada de rir. Nã foi nem mái nem menes a nã ser isso... Pronto, já f'caste a saber.

A Pedra Furada
E tamém há os que gostam de charolar um pôcachinho...

E foi tal e qual desta manêra qu' as coisas se passaram.

O pior 'tava p'a vir a seguir. Com a paraja, arrefecé-se. E p'a s' andar o resto do caminho até Barcelinhos - e inda faltavam bem umas duas léguas, p'ra más do que p'ra menes - foi uns trabalhos... Mái, até ô intardecer, dé tempo p'ra tudo.

E, agora, se qu'rerem ver os videos todos dos retratos qu' ê cá tirí no Caminho de Santiago e nôtros sitos, acalquem aí:

E até qu' a gente se veja.

3 comentários:

  1. Boa tarde e PARABÉNS!
    Descobri por acaso este blog e nem sei que diga: gostei, adorei, ri bastante,percebi tudo e com toda a carteza que passarei a bisbilhotar tudo o que aqui se passa.
    Sou natural de Lagos (mas vivo em Lisboa)e conheço bastante bem os termos e modos de falar aqui descritos, pois a minha ascendência á das Alfombras por onde igualmente se utiliza essa linguagem.
    Acrescento ainda que tive a sorte de ter privado de perto com o Prof.Pinheiro e Rosa, um estudioso (também) destas coisas.
    Bem, o dircurso já vai longo.
    Um abraço e "Até à volta".

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  2. Porque não criar um site/blog sobre a sua caminhada até Compostela? Tem com certeza material suficiente para criar um espaço exclusivo digno de visita.

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  3. Que espetaculo, é a minha terra a minha freguesia,bonito!

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Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"