22 junho 2006

Sanjoanada nas Caldas

caldas

Nas Caldas de Monchique usa-se a fazer umas belas Sanjoanadas...

Em noite de S. João usava-se a fazer uns grandes ad'vert'mentos nas Caldas. Ele era pular as foguêras, ele era balhar no mastro, ele era b'ber-l'e uns belos porretes e a famila fazia una ajuntamentos qu' era uma coisa que dava semp'e munto que falar.

Des qu' há uns belos anos, nessa méma nôte, duas manas, qu' ê cá nã sê o nome e méme que sabesse nã o alomeava, resolveram-se, pegaram nelas e foram espàirecer p' ô S. João das Caldas. P'a d'zer a verdade toda, elas nã foram bem só espàircer, elas foram foi encher o papinho e de que manêra. E mecêas já vã' alcançar bem o perquém d' ê d' zer isto.

As pobrezinhas, andavam um coisinho desmarridas, que nã l'e tinha par'cido inda denhum namorado e béque-me já 'tavam a ver os anos a passar l'gêros p'r diente delas e nada... E nã é que se possa d'zer que fossem assim munto mal jêtosas, mái o contráiro tamém f'cava mal a gente tem-mar.

Já se vê qu' indo as duas à noite de S. João, semp'e podia ser que se desse o caso de par'cerem p'r lá alguns môces, assim d' algum sito mái desviado, que nã nas conhecessem e a coisa corresse ô queres p' ô lado delas.

Ora, se bem o pensaram melhor o fazeram, e lá abalaram as duas, munto alabaritadas, caminho da Vila, a pé, assim ali o mê-entardecer, em ferros p'a que chigasse a hora da festa. Assim que se panharam lá, qu' elas moravam p' aí nuns charazes qualqueres, alugaram um carro de praça p' às levar caminho das Caldas.

Num nadinha, 'tavam lá e inda era bem de dia. Pensaram:

- Mana, atã agora o qu' é qu' a gente vai fazer? Isto inda nã 'tá por 'í quái ninguém...

- Olha, tem-se qu' esperar um pôco. Isso, os môces, hõ-de 'tar por 'í a par'cer e calha bem a gente 'tar logo aqui num ponto bom e, assim c'm' quem nã quer a coisa, ver-se s' eles repáiram bem na gente.

- Tens rezão, sa senhora. Mái isto inda é bem munto cedo, entes podíames s' ir assomar a tanta coisa bonita qu' há aqui nas Caldas. O qu' é que dizes?...

- Tamém 'tá bem. Já há que tempes qu' ê cá nã vô ali à Capela e gosto munto dela. A últ'ma vez qu' a gente 'teve ali foi no batizo da meçalha da prima Cesaltina, nã foi?

- Sê cá, já nã m' alembro bem. Mái qu' eles vieram p' ali tirar retratos, isso vieram, qu' ê até tenho lá um qu' prima me deu.

capela caldas

Que bonita que é a Capela das Caldas. E é fêta de pedra da nossa

E lá foram elas assomar-se à capelinha e à R'bêra do Lageado que passa méme ali ô lado. Nã é p'r nada, mái ê cá, todas vezes que vô às Caldas, nunca dêxo de lá ir tamém. Gosto daquela capelinha, o qu' é que querem... Aquelas peças de pedra da nossa, todas bem trabalhadas, dêxam-me os olhos a luzir.

Isto p'a nã falar do resto que 'tá ali à roda, tudo tã bem aconchegadinho. Vã lá, que logo vêem. É a calçada toda limpinha, uns bancos qu' é uma classe p' à gente s' assantar, as arves bem tratadinhas, a r'bêra com pôca água, que nã pode ser más qu' ela nã há, mái tã limpinha qu' até se vê os sap'-sapinhes tôdes lá no fundo das pôças. Uma coisa do melhor, qu' até dá cobiça.

Pôs as ditas manas tamém gostaram munto, qu' elas, passades dias, bem contaram a uma pessoa que se reveram naquilo e no resto qu' elas inda foram bispar despôs disso. E olhem que nã têm má gosto. Sã tudo coisas que qualquer um se péla p'r elas. Atã vejam lá:

Passaram lá no mêo das casa, aquilo p'r tod' ô lado tem alvoredo com umas sombras qu' até apetêce a gente s' ac'm'dar p' ali e dromir uma folga.

Assubiram p' ô lado do Barranco do Banho, aquilo é só mesas e banc's de pedra p'a quem qu'ser levar qualquer coisinha p'a c'mer, s'assentar e morendar lá, tamém à sombra de más alvoredo e panhando a fresquidão que vem daqueles tãinques qu' eles fazeram drento do barranco que passa méme entremê daquilo tudo.

Foram um nadinha mái preciminho e desataram a engrilar logo p' ô lado da Fonte dos Amores, qu' aquilo, q'ondo calha, semp'e 'tá p'r lá um casalinho de namorados, assim béque-me fugidos ô gentío de cá de baxo, p'a darem paleado um coisinho mái à vontade...

- Ó mana, atã aquilo nã é o Tóino que 'tá àlém jogado àquela moça?!... Quem sará ela? Ah, tem-se que ver bem quem ela é...

- Qual é o Tóino que dizes, aquele lá de baxo dos Rabôlos?

- Sim, m'lher. É ele mémo. Ai o marafado. Inda D'mingo, despôs da missa, 'tava lá p'r trás da ingreja com ôtra, já aqui 'tá nisto... Mái a gente tem que saber quem ela é.

- Atã, dêxamos 'tar caladas e faz-se de conta que nã se 'tá a ver nada. Arrodeamos além p'r aquela banda e, em chegando lá p'r cima, já se l'e vê a cara a ela.

E assim fazeram. Mái o Tóino 'tava com o olho nelas e, mal elas passaram p' ô lado de lá, pôs o braço im cimba dos ombros da moça e abalô foi-se imbora qu' elas nã l'e deram visto a cara. Aquilo tamém, p'r o que me contaram, era uma diaba qualquer, lá debaxo de Vila Nova, qu' ele tinha trazido na b'cicleta p'a passar o S. João bem ad'vertido.

De manêras que t'veram de s' acontentar em ver a fontinha e já nã foi pôco, que lá bem bonita é ela. E nã tardando nada, vieram logo p'ra baxo qu' aquilo ia-se chigando a hora da famila s' ajuntar lá p' ôs lados d' adonde s' ia dar o pagode.

fonte amores

A Fonte dos Amores, adonde alguns namorados gostam de palear

Atã e nã é qu' as duas manas, naquele entrementes que durô a foguêra, repàiraram qu' andavam lá dôs a l'e fazer olhinhes e a s' aprochegarem p' ô lado delas... Inda bem não, olhavam assim c'm' quem nã quer a coisa e eles semp'e a darem sinalinhes.

Lá mái p' à nôte, q'ondo rompé' o balho em força, já eles nã nas largavam. Era balhar as modas todas. Tã penas o tocador punha o fole im cimba da perna e encetava ôt'a moda, era eles logo a puxá-las. Aquilo foi até mái não...

Até que - dizem por 'í as más línguas - às tantas, já a nôte ia alta, dêxaram os quatro de ser vistos no balho, ninguém más sôbe deles fosse o que fosse. Muntos dizem coisas e loisas do que se tará passado com as duas manas no resto dessa nôte de S. João. Sará tudo verdade? Nã sará?...

Ê cá nã sê. E o que nã sê não posso contar. Mái calculo. E vomecêas, se l' apetecer, façam com ' ê cá, em-maginem o que l'e venha à cabeça, que, calhando, nã s' atribóiem.

Qu' ô certo, ô certo, o qu' ê sê é qu' elas as duas só chigaram a casa no ôtre dia, já o sol ia alto, todas desmastreadas, e soavam d'zendo uma p' à ôtra:

- Ai, mana, que bela Sanjoanada!... Mái que bela Sanjoanada!...

- É verdade, mana. Que bela Sanjoanada!... Nunca panhí ôtra com-m' esta!...

E vá d' imparem até mái não. E repisavam:

- Que bela Sanjoanada!... Que bela Sanjoanada!...

E, à som dos impos das duas manas, l'es dêxo tamém as minhas recomendaçõs e que passem tôdes uma bela Sanjoanada, p'r menes tã boa com' à delas, qu' ê cá, desta vez, vô-me ver com-m' é que são as Sanjoanadas do Porto, qu' os mês amig's tripêros convindaram cá este môro e a su Maria e a gente nã l'es ia fazer a desfêta de nã par'cer por lá, carago.

Agora só q'ondo voltar de lá, daqui p'r uma semana mái coisa menes coisa, é que l'es posso d'zer mái umas q'ontas patacoadas, qu' ê cá nã tenho nenhum comp'tador daqueles que parêcem uma malinha e se podem levar dum lado p' ô ôtre.

Tenham munta saúde e boa sanjoanada.

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Esta casa é bonita, mái nã sê o perquém da terem fêto, assim, nas Caldas. Mecêas sabem?

10 comentários:

  1. Olhe quimgraçado, inda onte le fali das S. Joanadas da Quinta de S. Sabastião, (qondo é era moce pequeno ) e mecê hoje fala das das Caldas que tamém sã bem porrêras.
    Come vai ó Porte ver os sés amigues, aprevête pra le desejar uma boa viaja e adevirtam-se, que aquile é bom, é uma note de doidêra, prencipalmente na Rebêra com a sardinha e a chouriça assadas e vinhe tinte. Tamém pode prevar uma francesinha e uma ruefa, quá a vender nas barrecas na Praça, nas Fontainhas e noutres sites tamém. Má se querer abrir os cordôs à bolsa, vá ciar lá ó D. Tonho ( o restaurante do Chique Fininhe), qaquilo é do milhor que há...
    Desculpe o incomode, mas aconselho-o a afincar umas belas marteladas e umas porradotas com o alhe pôrre naquelas bimbas, quelas naquela nôte sã danadas pá brencadeira.
    Se ir de carro tenha cuidade com o andamente percasa daquelas nanicas queles puseram na estrada pa contrelar a velecidade, senã pode apanhar uma murta e elas sã pesadotas...
    Dés le dê saúde e que o Senhor do Bonfim o ajude e áté à volta, qé até lá se ter tempo vou paleando um poucachinho.
    O amigue Campanico.

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  2. Peço-lhe desculpa por não ter (ainda) lido este seu post com atenção.
    Hoje é um dia de muita tristeza, em que faleceu a minha tia Maria do Carmo Lourenço (que trabalhou durante décadas na loja da D. Eva Caçorino), a pessoa que me incutiu desde pequena a estima pelos monumentos e tradições de Monchique, e que espalha uma saudade imensa no meu coração, que há-de recordá-la sempre pelas coisas preciosas que me ensinou.
    Simplesmente decidi deixar aqui esta singelíssima homenagem a alguém que me fará muita falta.

    Cumprimentos ao Ti'refóias.
    Mai' logo deixarei um comentário a propósito das suas palavras.

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  3. De partida para o Porto, não posso deixar de, em conjunto com a minha Maria, prestar também a nossa homenagem à D. Maria do Carmo, filha de Monchique, que amou sempre a sua terra. Obrigado e até sempre.
    E manifestar, toda a nossa solidariedade à Ana Pinto e família, em especial à D. Arminda, neste momento de pesar.
    MaD

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  4. Essas Caldas são de facto uma delícia de frescura, como as histórias que o Parente arranja e recupera.
    Boa viagem até ao Porto e boa sanjoanada.

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  5. Lá passou o S.Pedro e o compadre das Refoias tem estado muito "sogadito".... Espero q esteja tudo bem consigo!
    Quanto à casa que mostra na fotografia sei que o telhado foi feito pelo avô do meu marido ( que se chamava Vicente José d'Almeida e que era de Silves) e que há uma casa muito semelhante na zona de Sintra (a qual, supostamente, teria sido o modelo desta)... Infelizmente quem poderia contar a história melhor que ninguém (o meu falecido sogro) já não está entre nós...
    Vá dizendo coisas e aproveitando o momento aqui fica um VIVA a PORTUGAL!!!

    Cumprimentos!

    Carla (Maraffaada)

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  6. Pôs é Maraffaada, a ida do parente ó S. Joan do Porte deve ter sido de caxão à cova, pôs nunca más diz nadica, até já dá pa ter soidades...

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  7. Ó Sr. Campaniço, é cá distraí-me e nã dei pela viage do parente!! Lá a ver quande ele volta c novidades lá do Norte e com mais uns postezitos p nós lermes! Cumprimentes p si!

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  8. Maraffaada, o nosse parente e amigue Refóias já voltou do Porte, agora é cáde ser porreire o quele tem pa nos contar, havemes de nos adivertir munto quele tem jête pá quilo e é munte ingraçado, deve ser cá uma pessoa munta bem desposta...
    Passem tôdes bem com a ajuda de Dés e da Devina Previdença.

    O Campaniço

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  9. Ainda sobre a arquitectura diferente desta casa, este fim de semana tive oportunidade de ver ao longe a casa prima (n é gémea pois é um 'tacinho maior) em Sintra... Infelizmente n tinha máquina fotográfica p q registar mas n deixei de me lembrar da casa das Caldas... A pintura, o tipo de telhado eram em tudo semelhantes!

    Cumprimentos

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Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"