20 novembro 2006

Mái um pedaço de caminho

Monchique - Partilha do Concelho

Tã penas pus os olhos no marco da partilha do concelho, pensí: já tenho mê' caminho andado.

Ó ê 'tô munto atribuído ó atã já havia p' aí quem nã 't'vesse certo d' ê cá dar acabado a viaja a pé... Essa é que 'tava boa!... Ê cá dar parte de fraco?!... Nã senhora. Tã penas vi o marco da partilha do concelho, atã é qu' ê me joguí a andar à mecha toda...

'Tá bem qu' os caguetes já me 'tavam aqui a impertenecer, mòrmente, este que tem o joanete mái de fora, mái arrear é que nem pensar... E nã sê se foi p'r mode isso ó se não foi, vê-me à idéa:

- Olha, Refóias, uma àmetade do caminho já 'tá fêta. Ô concelho já chigaste. Agóra vê lá o que fazes... É bem verdade qu' a parte mái ruim é daqui p'ra diente, qu' isto, agora, é semp' a assubir, e a chuva béque-me tamém nã dá sinás d' alevantar. Más, isto nã há-de ter dúv'da...

Inda p'ra más, aparí logo um coisinho mái à frente p'r mode uma rabanhada de perdizes que p' ali 'tavam na bêrada da estrada e alevantaram-se todas ô méme tempo. Aquilo, batem as asas à rôpa toda, fazem assim um trrrrrru, qu' um homem, logo de chofre, até dá um estrameção e tem que estancar, méme descontravontade.

Más é uma coisa qu' ê me pélo p'r ver é aqueles b'chinhos... E as velhacas apoisaram logo mái prebaxinho, coisa duns q'ôrenta ó cinquenta passos, só p'a nã atravessarem a r'bêra p' à banda de lá. Inda l' apontí a mánica, mái os retratos nã deram panhado nada de jêto.

E só dali a um pôcachinho, é qu' ê deslindí qual a r'zão delas nã l'e calhar a ir lá p' ô ôt' lado. Foi só uma questã de dar mái umas passadas e devassar bem o trabalho qu' o vento tinha fêto p'r aquelas bandas.

Aquilo era só alv'redo partido p'r tôd' ô lado... Farrobêras, atão, que qualquer assopro l' e dêta as pernadas a baxo, foram a êto. E méme as acáiças nã l'e f'caram atrás. Até p'r a raiz ele as arrencô.

Mau tempo em Monchique Mau tempo em Monchique Mau tempo em Monchique Mau tempo em Monchique

Com a besaranha que já tinha fêto antes, era só arves partidas logo à rèzinha da estrada. O que faria, lá mái p'a longe...

Vá lá qu' ele, nesse mê tempo, fez uma abertazinha e ê apr'vêtí p'a abrir o passo, qu' aquilo ali inda nã era munto de ladêra acima. Mái nã foi arrencada que durasse munto tempo qu' mal ia chigando ô Vale de Boi, apara uma via em par de mim e oiço logo uma voz:

- Eh, Refóias, atã vás aí à pata, nã queres uma b'léa?

Dig' p'ra mim:

- Mái atã isto é a fala do ti Luís Agúida...

Olho p' ô lado e era verdade. Ali 'tava ele no sê mata-velhos de caxa aberta, com um tapigo de plástico p'r cimba, com a m'lher - a ti Felismina - assentada ô lado. Tinham ido fazer a praça e já 'tavam de volta.

- Isto é só de dôs lugares, mái vás méme ali atrás, qu' eles, com esta enverna, nã hã-de 'tar pr' aí e murtar a gente...

- Dés l'e pague, mái fica p'a ôtra ocasião. Nã l'e parêça mal, mái hoje tirí p'a fazer este caminho a pé.

- Ai, home, escolhêste um dia munto ruim p'a tal serviço. Anda más é daí com a gente, senã chegas a casa que nem um pinto. E bem aventujado...

E dé uma grande carcachada, quái a fazer porra de mim, qu' ele via-se ali no cómado do sê belo mata-velhos e era mái que certo que já trazia uma bagadinha na asa, qu' aquilo, q'ondo se vai fazer a praça, já se sabe o que se ...

- Eh'q, vá lá vomecêa andando qu' a gente logo s' incontra lá na Vila, mái-logo.

E nã fosse tamém o velho 'tar munto escarado e pregar com a gente duma barrancêra abaxo...

- Olha, p'a quem nã quer há munto... Até mái tarde.

Disse-m' ele, já béque-me a aç'larar aquilo.

Inda 'tive p'a l'e prècurar s' ele nã tinha visto p'r 'í o amigo Campaniço, qu' há tant' ô tempo que nã sê nada dele, mái c'm' homem 'tava assim p' ô lado do quentinho, dêxí-o ir à vida dele.

E lá abalô a aç'larar o mata-velhos duma tal manêra qu' aquilo até zunia... Nã sê perquém, descuidô-se, quái ô chigar à curva, pende p' ô mê da estrada, vem de lá um camião carregado de borregos dá-l'e um apitadelão, punhana!, o homem há-de ter panhado um cagáiço... vira o mata-velhos p' ô lado dele, aquilo foi p'r um nadinha que nã se dé ali uma desfortuna.

De manêras que, lá fui andando más um pôcachinho e toca a tirar mái uns retratinhos, acolhido ali debaxo dum alv'redo, p'a ver se furtava a mánica de panhar munta chuva im cima, qu' ê tinha medo nã fosse ela s' avariar, ó apr'vêtando alguma aberta que tamém vinha d' ora em q'onto.

Aquilo foi coisa de pôco tempo, logo com esta linda casa d' ôt's tempos qu' eles, agora, arrenjaram e l'e chamam o Parque da Mina. Aquilo tem p'a lá umas coisas, uns bichos, umas cabras... Olhe p'a l'e d'zer a verdade, nã sê bem qu' inda lá nã antrí. Só tenho visto p'r fora.

E mái preciminho, logo prebaxinho das Caldas, 'tá este jardim zológico, o Omega Parque, qu' há-de ser coisa bonita de se ver, mái tamém sô franco, tenho um empenho marafado em ir lá devassar aquilo e inda nã arrenjí jêto de dar lá ido.

Parque da Mina - MonchiqueOmega Parque - Monchique

Tanto faz o Parque da Mina c'm' o Omega Parque, tenho qu' ir lá agora em passando este enverno.

Dé-me assim que pensar este nome: Omega Parque. E, inq'onto assubia até às Caldas, puz-me a ramoer que jêto l'e ch'marem assim. Já quái que me saía fumo p'as orelhas de tanto puxar p'r a cabeça, desato a falar méme sòzinho:

- Atão, omega é a últ'ma letra do àbecedáiro grego. Aqui só 'tã bichos que têm os dias contados. Calhando é p'r mode isso.

E ele é capaz d' ê cá nã 'tar atribuído. Aquelas raças de bichos des que 'tão a caminho de s' acabarem e eles cudam deles ali a ver s' eles arrenjam criação de pequenalhos p' ôs soltarem otra vez no sito d' adonde estes vieram.

De manêras que, c'm' eles 'tã no fim, puseram-l'e o nome da letra do fim do àbecedáiro. 'Tá bem visto, sa senhora. Isto dig' ê cá, mái sê cá s' é assim ó não...

Pôs olhe, o que l'es 'tô de'jando é qu' em lugar de Omega passe a ser Alfa, a pr'mêra letra do tal àbecedáiro, p'a ser o prencípio d' haver, ôtra vez, muntos b'chalhos daqueles lá nos matos adonde eles vevem aí p'r esse mundo afora.

E q'ondo mal dí p'r mim, 'tava com mái uma ripada d' água nas orelhas, quái ô chigar às Caldas. Inda pensí ir p'r o encurtadoiro qu' ê cá usava passar, nalgum tempo, q'ondo era moço, e vinha da Nave panhar a carrêra nas Caldas, qu' assim apôpava uns dez destõs no b'lhete p'a Vila Nova.

Aquilo, méme sendo munto de ladêra acima, vai logo dar lá passando ô Água da Sola e, p'a quem 'teja com pressa até que s' apôpa ali um belo pôcachinho. Mái, pensí:

- Atã, com um garrão d' água desta manêra, nã sará melhor t' abrigares um pôco ali na paraja da carrêra e, despôs, logo l'e dás mái uma arrencada?..

Assim o pensí, assim o fiz. Num 'nstantinho, já ê lá 'tava acolhido debaxo, tirando mái uma mêa-dúiza de retratos. E olhem qu' as Caldas é um sito adonde dá bem p'a um f'lano incher o papinho seja ele a devassar aquelas lindas coisas seja l' a tirar retratos.

Caldas de Monchique

A capela das Caldas 'tá num sito méme bonito. À roda, tem arv'es e flores e, p'r trás, a r'bêra do lageado.

Caldas de Monchique Caldas de Monchique Caldas de Monchique Caldas de Monchique

Nã é um consolo olhar estas lindas vistas das Caldas de Monchique?

E inda bem qu' ê nã fui p'r o encurtadoiro. Senã, nã tinha visto mái uma vez as Caldas, arrodeando semp'e p'r a estrada até ô Barranco do Banho - agora l'e chamam R'bêra do Banho, qu' é mái fino... - e nem tampôco dava p'r a minha Maria passar na carrêra das onze.

Olhem, a marafada, consoante a carrêra passô p'r mim, lombrigô-me logo. E vá de fazer adés e ria-se que se derretia... Qu' ê cá bem na vi p'r o vrido da j'nela, méme embaciado qu' ele 'tava. 'Té o chòfer, qu' é moço conhecido, mái visto bem qual deles era, tocô o apito da camineta a se meter com-migo...

E ê cá ali prê acima a andar, já mê coxo duma perna, p'r mode uma borrefa que me 'tava a narcer no calcanhar... Num derrepente, inda quái que joguí um fiaço atrás da carrêra p'a l'e fazer paraja, mái voltí-me p'ra mim e disse logo, bem de rijo:

- Tem conta, Refóias... Atã que conversa é essa? Abalaste a pé, há-des chigar a pé a casa. Toca a andar qu' inda há munta ladêra p'a assubir...

E lá fui.

E c'm', desta vez, inda nã l'es dô contado o resto, fica p' amanhã ó despôs.

Fiquem-se com Dés.

5 comentários:

  1. Olá Compadre! É um regalo ler mais um bocadinho da sua viagem serra acima! Este fim de semana, qd ia a caminho de Monchique (vinda da Vila Nova) lembrei-me várias vezes de si! É muito caminho, a estrada n tem bermas como deve ser, estava a chover (no sábado tb choveu que se fartou) mas conseguiu levar a sua avante! E ainda tirou uns belíssimos retratos - parece q a chuva realçou ainda mais a beleza da paisagem! A curva da Ribeira do Lageado sempre foi dos meus cantos preferidos da estrada e à noite, com a iluminação, fica ainda mais bonita!!
    A minha pequenalha ainda n tem idade p apreciar as vista mas n estranhou nada a mudança de ambiente, o q nesta fase, é muito bom!
    Cá aguardo a passagem pela pedreira, pela Nave e pela Meia-Viana!!

    Muita saudinha a si e à Sra. D. Maria!

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  2. Meu caro parente

    Após un dias de ausência entro aqui para visitar este típico cantinho e deparo com esta fabulosa reportagem sobre o temporal.

    Sim senhor!

    Abraço e boa semana

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  3. Já tô a ver que fali cede demás!
    Parabéns pelas imagens do percurso e sua descrição.
    Um abraço.

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  4. Eh Ti Refoias, se vai bem lançade, já chigou ás Caldas? Isse é qué andar! Posso d'zer-lhe que inda nã fui ó parque da Mina mas ao Omega já fui e tiri lá uns retrates mas a maioria dos biches sã macacos (macacos me mordã, hehehe). Tem tamem esquilos e chitas mas o que tem mais é mesmo macacos. Ê vi aquile este Verão passade e até gusti, tive a sorte de ir lá num momente em que távon a fazer uma visita guiada, a módes qu'apanhi o qu'ion d'zende. Munts cumpriments parente Refoias.

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  5. M't'ôbrigado a tôd's, mês belos amig's.
    Tenham munta saúde.

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Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"