Tã penas a precissão chigô ô fim e tirí lá os mês retrates na ermida de Sant' Antóino, pego em mim, dô vaia à minha Maria e às duas amigas dela lá de baxo de Vila Nova, que par'ceram p'r cá, e toca a andar caminho lá debaxo d' adonde a gente se podia ad'vertir ô consoante da festa.
A pr'mêra coisa adonde s' embicô logo foi a carmesse. Toda munto bem aconchegadinha com ramaja de calitro e uns enfêtes de cores qu' aquilo só o chêrinho era um consôlo q'onto más o resto, tudo com cores do mái bonito que podia ser.
É menino, aquilo era quái só m'lherio, tudo jogado a comprar b'lhetes, qu' as meçalhas que lá 'tavam viam-se em traquetes p'a dar agu-ento a despachar os fregueses tôdes...
Ora, ê cá tinha-me desquècido do mê chapéu no a't'móvem da amiga da minha Maria, a Florbela. É um abirum d´aba larga, qu' ê uso a levar só assim em dias de festa q'ondo o sol 'tá munto forte.
Enq'onto esperava e nã esperava que me vendessem p' ali um punhado de b'lhetes, o sol dé-me em acalar na cabeça, já o suôr me escorria ô cachaço abaxo e aquilo nã me 'tava a calhar lá munto bem. Digo:
- Ó menina, veja lá se me despacha tamém aqui a mim, qu' ê tenho o sol p'r trás e isto nã é grande coisa 'tar assim à torrêra sem nada na cabeça...
- Tenha calma ti Refóias, atã nã vê qu' ê 'tô a atender estas pessoas que chigaram pr'mêro... Ê já vô-me aí.
- Atã, veja lá se nã amarrôa só 'í p'r esse lado, qu' ê já 'tô aqui empeçado com esta calma.
Mái, naquilo, foram-se embora umas que 'tava ali do lado da sombra, mái a palear qu' a comprar b'lhetes, e a gente os quatro nã se dêxô fugir a ocasião d' ir logo p'a lá, que semp'e se 'tava mái à fresca.
Até qu' a moça lá s' arresolveu a vir p' à rés da gente. Aí, jogames-se tôdes ôs b'lhetes im forte. Ê cá comprí logo alguns vinte... 'Tá bem qu' aquilo eram assim mái p' ô barato que p 'ô caro, mái semp'e me custaram um ero...
- Vá Maria, desembrulha aí neles à vontade!... Dêxa lá a ver o qu' é que sai aqui à gente... Isto, com tanto prém'o àlém naquelas pelhêras, algum há-de sair. Ê nã uso a ser munto afort'nado nisto, mái tu, Maria, tens semp'e mái sorte qu' um cã' de caça, desenrola aí neles...
- Ó homem, nã faças tanto lanedo. O qu' é qu' a famila vai d'zer?... Pensam que tu já 'tás com um copinho. E quem sabe lá se nã 'tás... Enq'onto ê fui ali à sacr'stia, com a Florbela e a Zèlinha, dar-se uma esmola p' ô Sant' Antóino a ver s' ele a aux'lêa com um namorado qu' ela arrenjô agora, calhando, bebeste-l'e p' aí alguma coisa com os tês amigues...
- Eh'q! Que conversa é essa?!... 'Tive semp'e ali à porta da ingreja a ver a mús'ca chigar. E tocaram-l'e ali umas modas méme boas...
E vá de desenrolar b'lhetes. Tudo branco, tudo branco...
Nisto, a minha Maria:
- Olha, cá 'tá um!... É o trazentes e onze. Ai que bom. Que sará qu' ê vô ganhar...
- Ê nã disse?!... Esta m'lher, p' ô lado dela é que corre tudo...
- Cala-te, cala-te... Que tu, uma ocasião, tamém te saíu nã sê o quem lá na fêra de Monchique.
- Ó menina! Menina!... Venha cá qu' a minha Maria já tem aqui um com prém'o. É o trazentes e onze.
E a meçalha lá vêo, pega no b'lhete e vai p' ô lado de lá. P'lo jêto, pôs-se p'a lá a vender b'lhetes a ôtres, nunca mái par'cia e ê já nem na 'tava a ver aquilo bem. Até parí de derenlorar b'lhetes e tudo. Pensí:
- Querem ver qu' o raça da moça inda me perde p' além o b'lhete e se desquece da gente... Anda-se, anda-se, fica-se sem prém'o denhum.
- Ó homem nã sejas desensofrido. A mecinha já vem. 'Pera aí...
- Olha, ê nã m' ent'ressa. Era o trazentes e onze e nã me venham cá com coisas...
Até qu' ela lá s' arresolveu e par'ceu com uma coisalha na mão, pequenalha, mái des que de munto valor:
- Aqui tem, ti Maria. Um galo im loiça da China qu' é p'a mecêa pôr o azête. Pega-l'e p'r o rabo e despeja-o p'r o bico. Nã vê?
- Most'e lá. Ah... Olha que coisa mái jêtosinha.
- Cudado, nã dêxes cair isso, Maria. Olha que s' a rapariga diz qu' isso é da China, há-de ser coisa de munto d'nhêro... Qu' ê semp'e tenho ôvido d'zer qu' as loiças do Oriente sã do melhor que há.
E, p'a d'zer a verdade, aquilo lá nos pés do galo tem uns gatafunhos qu' ê nã dô lido e, ô lado, 'tá: "Made in China".
E se 'tá lá a d'zer isso é qu' aquilo vêo méme da China e há-de custar um belo d'nhêro a qualquer um qu' o quêra comprar.
De manêras qu' inda se desembrulhô o resto dos b'lhetes, elas compraram mái uma pagela deles e 'tavam tôdes brancos, mái foi-se charolando e q'onto mái se comprava mái se perdia. Nã saíu mái coisíssema nenhuma nem a mim nem a elas...
Digo ê cá:
- Vames más é p'a ôt' lado qu' isto aqui já dé o que tinha a dar... 'Tá bem qu' o tê prém'o foi bom, mái s' a gente se desaprecata, inda se gasta o qu' ele vale. Se nã ser más...
E assim fazemos.
Saca desenlaca, logo da banda de baxo, 'tava a barreca do jogo do bicho... Ora, f'camos logo lá caídos.
Más iss' ê logo l'es conto amanhã, qu' é p' a nã nos impertenecer munto. Mái nã fiquem a cismar qu' é o jogo do pàlito, que nã é. É ôtro.
Atã, fiquem-se com Dés.
Coisas tão lindas meu caro! A sério que me dá um arrepio de ter/sentir o seu mundo tão próximo... E a sua Maria tem sorte, além do galo made in China (como tudo...) tem-no a si e esses olhos impressionantes que captam o coração das coisas.
ResponderEliminarAbraços para vós.
Minha bela amiga, Dés l'e pague essas palavras tã bonitas que diz de mim e qu' ê cá gosto de ler, mái sê que sã assim um coisinho de más.
ResponderEliminarMuntas recomendaçõs minhas e da minha Maria qu' é quem lê as minhas patacoadas logo em pr'mêro lugar...
Mas tantas rifas que eu comprei nessa quermesse, da festa de Sto. Antonio!
ResponderEliminar