01 maio 2006

Dia de Maio foi-se desmaiar p' à Fóia: A abalada

O correpito da Fóia, já há uns belos anos, num Maio empoado

Dia de Maio é p' à gente ir por 'í fora, levar-se um decomerzinho e c'mer-se em qualquer banda. Ê cá, adonde gosto mái d' ir é p' ôs lados da Fóia ó da Picota. Foi uma coisa que, désna de novo, semp'e m' habituí e, atão, gosto semp'e de fazer.

Q'ondo inda era môç'-pequeno, chigava a abalar sòzinho p'r' aqueles matos, até ô bico dos cerros, e q'ondo já nã dava assubido más, olhava p'a tôd's os lados e f'cava ali, um belo pôco, a afègar, a sentir a brisa no vertente e a ver as vistas ô mê redor.

Agora, as pernas já me vã faltando, vô lá q'ondo calha e a munto custo... Mái ô Dia de Maio, só p'r alguma desfortuna é qu' ê dêxava d' ir. E lá fui ôtra vez. É qu' ê gosto méme daquilo. Até me pelo...

Bom, mái vamos c'meçar p'lo prencípio.

Logo de béspra, a minha Maria, que, nã é p'r ter casado com-migo, más é uma m'lher de g'verno, aprecatô-se, logo, com-mo deve de ser. Inda era mêa-tarde, já ela 'tava agarrada ôs alguidares e àquela trugia qu' ela tem p' ali p' à casa de despejo. À boca da noite, já ê me chêrava a fritos e bolos.

Aquilo, quái de certeza, qu' era q'ond' ela 'tava a fazer as f'lhós de pol e uns b'scôit's qu' apresentô no Dia de Maio. P'a nã falar do bolo de tacho qu', a mê ver, era o melhor dos que lá par'ceram. Mái morcelas, chôriças e presunto tamém nã faltava lá nada. E uma garrafinha de madronhêra que faz semp'e munto jêto...

Ê tamém, achí qu' ela qu' era mer'cedora e fiz-l'e o g'verno todo cá p'r fora. Até da galinha choca, a Bicosa, qu' ela dêtô ali no sobrado com nã sê q'ontos ovos, ê cá tratí. Tratí... Dí-l'e p' ali uns bagos de milho, qu' ela pôco come, e dêxí-l'e uma cêlha chêinha d'água, qu'o bicho, atão, nã pode passar sede, qu' o telhado é de telha vã e faz ali munto calor.

Mái, nesse mê tempo, já se tinha combinado com uma preçanada de famila p'a s' ir desmaiar todos em companha uns dos ôtros. Olhem, o mê compad'e Jôquim do Barranco e a C'stóida c'madre foram logo os pr'mêros. A ti Zabel T'mé e a Cilinha, tamém. Assim qu' o Zé Manel ôvi d'zer qu' a Cilinha ia, disse logo que tamém qu'ria ir e vinha logo de béspra lá de baxo.

E inda más o parente Tóino Choça e a prima Mari' Olinda, que méme morando desviados, d'zeram logo que 'tava aqui às horas que fosse pr'ciso. O ti Manel dos Pôrtos e a prima Lúiça, fazeram logo o jêtinho p'a ir tamém. Eles 'tão p' além amigados, mái p' à gente é c'm' serem casados. Nã se pode olhar a tudo...

E inda foi tamém o ti Zé Caçapo - ah, velho marafado!... Aquele que 'tá semp'e a sovinar... - e o ti Zé da Côrcha e a m'lher, a ti Balbina da Corte. Ah... E já me desquecia da prima Anica e o filho, o Tóininho Piôrra, qu' inda hoje tem a mania de jogar ô pião méme já quái com vinte anos.

Ora, era uma alcatrefada de gente que par'cia a excursão da Mãe Sob'rana, mal acomparado 'tá bom de ver. Mái lá s' abalô, já o sol ia alto, qu' aquilo o Zé Manel é um adregue s' alevantar alguma vez a horas, e o ti Zé Caçapo tamém tardô um belo pôcachinho.

O moço é p'rque anda desnoitado da maràzice, agora o velho é p'rqu' é malandro. Ele, muntas vezes, faz méme d'a pr'pósito só p'a judear com os ôtros... Éh'q! Já o tenho panhado em tantas que já nã ligo... O que vale é qu' o raio do velho ás vezes até é ingraçado.

Inda, Dia de Maio, chigô ô pé da gente, tarde e más horas, a d'zer, sem vergonha nenhuma:

- Mái atão, já 'tã tôd's aí?!... Vinha contando ter de esperar aí uma remessa de tempo p'r vomecêas... Que bicho é que l'e picô p'a alevantarem tã cedo?

- Ó ti Zé, se nã calha a chigar neste 'stante, já nã panhava a gente aqui, qu' a gente barimbava-se em si e abalava-se... Tenha a certeza disso. - Disse-l' ê cá, com cara de pôcos amigos.

- Havera de ser bonito... Ê, tamém, pôco me custava a panhá-los, q' uma parte dos qu' aqui 'tão, sã pôco mái que lesmas a andar. E, más a más, qu'ê sabia p'ra dond' é que vocêas iam... Sim qu' ê nã nos podia perder de vista, qu' ê nã tenho m'lher p'a m' arranjar a cesta e nã trusse farnel. Aí o Refóias usa a levar a cesta bem chêazinha, já 'tô governado...

- Se vem ôtra vez à gosma de c'mer às tensas dos ôtros, cá p'o mê lado 'tá munto mal enganado, ti Zé. Daqui nã leva nada... - Respondí-l'e, só p' ô impertenecer, qu' a gente nunca se dêxava o probezinho passar mal...

E, enq'onto tôd's p' ali se c'meçavam a ajêtar p' à abalada, inda fui, num 'stante, ali ô alpendre, pus a mão do lado de drento do pestigo da porta da casa das batatas e alcançí uma garrafinha, mêa d' aguardente, qu' ê tenho semp' ali numa pelhêra qu' ê fiz na parede de taipa, logo encostada à porta.

Ora, dí uma rodada a tôd's p' à abalada. Mal acabo, descudí-me, vem o ti Zé Caçapo p'e trás, joga-me a mão à garrafa e vá ôt'a rodada.

- Vá, bebam tôd's, qu 'esta é p'r conta da casa. O homem nã gosta de ver ninguém com sede... - D'zia ô velho a rir. - O dono fica de castigo, nã bebe desta... - E vá más uma carcachada.

Ele foi logo o pr'mêro a b'ber. Dé ôs ôtr's tôd's, men's as m'lheres qu' essas, méme qu ' alguma l' apetecesse, t'veram vergonha. E, no fim, b'bé ele ôtro, o marafado... É que nã tem pingo de vergonha naquela cara... Enq'onto dé um ôs ôtr's, ele bebé dôs.

Já 'tava a ver que nã sobrava nenhuma p'ra mim. P'a d'zer a verdade, ele, no fim, semp'e me despejô um calcesinho, mái já nem tampôco foi bem chêo, que nã havia más... 'Tá bem qu' a minha Maria levava lá ôt'a garrafa na cesta, mái ê é que nã me calhava 'tar a encetá-la logo ali.

E, enq'onto fui pôr a garrafinha ôtra vez no méme sito, c'meçô tudo a andar e lá se foi caminho da Fóia.

Hoje fica-se assim, qu' o resto logo l'es conto q'ondo ter jêto disso.

E vomecêas, que tal de Maio?

Haja saúde p'à gente tôd's.

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