Estas escalêras, logo por si, já sã bonitas, mái no mê delas 'tá uma coisa que só vista. Já, alguma vez, f'zeram com' ê cá, qu' ia assubindo p'r elas e méme quái lá em cimba, olhí p' ô lado, vejo uma coisa tã jêtosa qu' entrí logo ali prê adentro de rompante?
Pôs, foi o qu' ê fiz melhor. Ia com o ti Zé Caçapo, nisto, entro assim p'ra lá, o homem, que nã sabe ler nem uma letra do tamanho dum boi, fica espècado a olhar p'ra mim e p'à tab'leta que 'tá p'r cima da porta e pergunta, munto contente:
- Refóias, atão iss' é alguma venda nova que 'tá pr' aí? 'Tá munto bem arrenjada...
- Ó t' Zé, atã nã vê que nã é uma venda... Ist' é uma casa adonde vendem coisas de barro, home. Olhe lá o que 'tá aqui a d'zer nestas ripas...
- Ah, vendem aí enfusas e alguidares?... Calha bem qu' ê 'tô a precisar dum alguidar p'a q'ondo mato o pórco picar as carnes. E p'a ôtr's serviços qu' isso é um tareco que faz semp'e jêto p'a tudo.
- Lá 'tá vomecêa... nã é coisas dessas. É bonecos e coisas assim, q'um homem p'a li faz e pinta. E tem aquilo p'a vender ôs 'trangêros qu' eles pagam bem p'r coisas dessas.
Ô mémo tempo, foi-se entrando os dôs. Nã l'es dô encarecido o chêrinho que 'tava logo naquele largo d' entrada. Aquil' era só flores!... E bem tratadas qu' elas 'tavam. O ti Zé nã achô munta graça, qu' ele ia com o engôdo de b'ber uns calaiços lá im cima no café, disse logo:
- Eh'q!... O qu' é que sará qu' a gente vem p' aqui fazer?... Atã s' a gente nã é estrangêros... Até me dé vontade de garrear com ele. Quer d'zer, de l'e ch'mar nomes. Mái nã l'e posso d'zer o anexim dele senã ele marafa-se. Vá lá alguém l'e ch'mar Verruma... Endoida logo.
- Venha lá daí ver isto, que nã se paga nada, e despôs logo se vai adonde se tinha combinado. Atã nã vê qu' o homem tem aqui coisas bem trabalhadas?... Olhe lá ali, p'r baxo do alpendre, aquelas bicas. Até corre água e tudo...
- P'a d'zer a verdade, aquilo até 'tá bem caçado...
Aí já c'm'çô a olhar d' ôtra manêra p' às coisas e até ele é que quis entrar lá em casa.
Q'ondo o homem que 'tava lá vi' a gente s' aprochegar, pôs-se a olhar. E nã era caso p' a men's. Atã, olhem bem. Aquilo era dia de semana, ê cá ia um coisinho mal arrenjado, p'a d'zer a verdade. Levava p' ali umas botas de cabedal com sola de borracha e umas calças de trabalho azus, já bem munto debôtas, e o chapéu tamém já 'tá um coisinho usado.
Agora o ti Zé Caçapo inda ia munto pior. As botas eram cardadas, faziam um barulho naquela calçada que f'cava tudo a olhar, as calças, nã sê se de cotim se do que eram, todas puídas e arremendadas nos fundilhos, a camisa já nã se conhecia a cor, toda remontada, com as pontas atadas num nó ô pé do embigo...
C'm' é o homem nã havera d' olhar. Ele há-de ter pensado:
- Mái o qu' é qu' estes dôs entrôchos vêem fazer p' aqui, senhor?!... Se calha a par'cer algum estrangêro, nem tem nada em fugir logo ô dar com uma coisa destas. E s' o negóiço já 'tá ruim, com estes trapêros aqui, atão, escramontam-me a famila toda, nã vendo nada...
Tenho p'ra mim, qu' isto era o qu' ele 'tava a pensar, mái veja lá com-m' às coisas são. Atã nã é que, inda bem não, até par'ceu d' apr'pósito, antram logo duas m'çatonas grandes, munto jêtosas, chêazinhas de calor - da manêra qu' elas vinham vestidas via-se logo que 'tavam encaloradas - e c'meçam a bispar aquilo tudo.
Mal chigaram ô pé da gente, c'meçam-se a rir. E vá de fazerem p' ali uns miécos e de d'zerem coisas qu' a gente nã entendia. Ora o ti Zé é marafado c'm' mecêas sabem, ê cá tamém gosto da charola, pusem's-se a rir com elas. E lá o dono d' aquilo a olhar e tamém, béque-me, já com um arzinho de gozo.
De manêras que andô-se lá a ver aquilo tudo munto bem. E coisa mái bonita, assim naquele jêto, inda nunca tinha visto. Olhe, tem lá desenhos de tudo o qu' a Vila tem d' airoso. A igreja, o convento, as ruas e casas antigas e munto más coisas da Vila e sem ser da Vila.
Foi uma sast'fação ver qu' a nossa terra tem coisas assim e pessoas com tanto valor. Dig'-l'es, à confiança, p'a irem lá ver aquilo e comprarem o que qu'serem que ficam bem servidos. E tenho a àbs'luta certeza que mecêas tamém vã f'car embasbacados p' àquilo. E apr'vêtem a ir lá p'r estes dias qu' as hortênsias hõ-de 'tar carregadinhas de flor.
Mái voltando ô méme, o rai' das englesas, ó nã sê donde elas eram, nunca mái tiraram as vistas de cima da agente. Pus-me a pensar:
- Mái o qu' é que sará qu' esta velhacas querem da gente, senhor?!... Elas novas, a gente já velhos e entrapêrados desta manêra.
Digo p' ô ti Zé:
- Ó ti Zé, mecêa já viu aquelas maganas semp'e a olharem p' à gente e a se rirem? O qu' é qu' aquilo esperam daqui?...
- Já se vai saber. 'Pere aí qu', em a gente saíndo, fica-se ali a engònhar p'r perto a ver o qu' elas fazem...
Pensí só cá p'ra mim:
- Olha lá o marafado do velho, inda pensa nestas coisas...
Mái, nã tardando nada, vi'-se logo o qu' é qu' as moças qu'riam. Vieram ô pé da gente e vá d' apontar p' ôs dôs e p' a uma maquinazalha qu' uma tinha na mão. Ora, era p'a tirar retratos à gente...
E a gente que s' importô... Foi-se lá p'a fora p' ô alpendre, qu' o homem nã quer que se tire retratos às coisas qu' ele tem lá drento de casa, e foi um vê se t' avias. Retratos de toda à manêra e fêtio...
E assim s' acabô a v'sita a uma coisa tã bonita qu' ali 'tá e, calhando, inda há um ó ôtro que passa ali perto e nã l'e dá p' a entrar. Mái qu' aquilo é uma coisa de categoria, é...
Lá seguimos o nosso caminho, mái, pr'mêro, inda s' olhô bem, cá de cima, p' às Escadinhas do Adro. Tem uma vista do melhor que há. Até se vê a Picota, lá ô longe.
E fiquem-se na paz. Até ôtro dia.
Parente
ResponderEliminarAs Escadinhas do Adro vistas, por si, quer seja de cima, de baixo ou de lado, são das mais bonitas que os meus olhos já viram.
Que a paz fique consigo, também ;).
~*Um beijo*~
Despertou-me uma grande vontade de dar um salto a Monchique.
ResponderEliminarTalvez já esta tarde.
Por acaso já tive o prazer de visitar essa rua e essa casa e vale a pena sim senhor! É do mai lindo que pode haver!
ResponderEliminarEstive agora mesmo a ler o comentário que deixou no meu espaço, muito obrigada por se ter lembrado da exposição que tenho em Portugal desde o dia 20 de maio. É uma exposição permanente, pode vê-la quando passar por Carvoeiro num bar com internet que fica quase junto á praia e que se chama comput@as bar. A exposição chama-se "Sorrisos do Mundo" e tem sorrisos de várias partes do Mundo retratados de uma maneira muito única. Deixei lá um bloco para comentarem. Espero que gostem!
ResponderEliminarErrata: o nome do bar é comput@s bar
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