20 março 2006

Marmelete

Marmelete vista d'ô pé da capela de S. Antóino

Mecês, se calhar, inda nunca t'veram em Marmelete, más é um conselh' que l'es dô é q'um dia que l'es faça jêt', passem pre lá.

Nã é pr' ê cá ser aqui da serra, más é um povo bonit'. Tá bem qu'é pequenalho, mái a gente assenta-se ali naquela venda que tá log' à chegada, bebe-se um calcesinho dela com uns amig's bons que 'pareçam, entretem's um belo pôco, quái qu nã s'ôve barulho nenhum e os ar's sã bons.

Inda, D'mingo, ê fiz isso. Tava lá o mê parente Tóino Choça, más o ti Manel do Arroio e, despôs, inda s'ajuntô tamém o compad'e Zé do Alto. Foi um consolo. Cada um mandô vir a su' rodadinha, paleamos, d'ssemos uns dichotes, umas parvoêras e, a mê' da tardinha, cada um abalô p'ô sê monte. Tôd's se tinha governo p'a fazer.

O mê parente usa o méme caminho do que eu até ô apartadoiro p'a Refóias, de manêras que lá viemos os dôs charolando. É qu' aquilo inda se leva quái uma hora désna do povo até ô desvio p'ô mê monte... Pôs, nã deve de ser men's duma légua.

O parente Tóino teve-m' a m'a contar que tem andado p'a lá empeçado com 'ma dor numa perna, des qu'é uma ciética, e nã dá conta daquilo. Já foi ô endrêta, já foi mandar fazer uma benzedura, até um chá de lagrimóina a m'lher já l'e fez. E nada. Até já anda com vontade d'ir ô dôtor...

Des qu' aquilo l'e c'meçô, ontordia, q'ondo teve a mudar p'a lá um pórco de pecilgo, e o marafado embirrô que l' havia de passar pre baxo das pernas. Ora, o probrezinho, q'ondo mal dé p'r isso, tava amontado no bicho e nã demorô nada que nã t'vesse espaldêrado no chão.

Aquil' o pórc ' é o bicho mái tem-môso que há. Q'ond' ele pensand' em ir pr' um lado, leva tud' à frente.

- Parente, atã faça boa viaja a pé até ô Val d'Água, qu' ê desapart'-me aqui p'ô mê caminho.

- Vá com Dés, parente, e dê lá rec'mendaçõs à prima Maria, fazendo favor - Respondé-me ele.

- Sarã entregues de boamente.

E, inda bem não, cada um já lá ia p'a sê lado a pensar no g'verno qu' inda tinha p'a fazer entes da cêa. Qu' ê, tamém, agora, só tenho p' ali um pórco p'a tratar e mêa-dúiza de coelhos. A galinhas, quem trata é minha Maria.

Tó, diacho, atã e já m' esquecia do mê Jericó. Tamém tenho que tratar dele qu' aquil' é um burro de estimação...

Com isto tudo, ia tã descudado que nã dí pr' o Sol de pôr e já tava lusco-fusco. Nã tinha levado alenterna, vô ali prê-abaxo, já a chegar ô pé da Casa Velha, embico num rabôlo que tava no mê da carrelêra, dô dôs passos em falso, pensí:

- Vou bater a àpèrája...

E nã faltô nada. Vá lá, que tav' ali um madronhêro com uma pernada pendida p'ô caminho, foi a minha salvação. Agarrí-me a ela, pr' ali me sigurí de qualquer manêra, mái, méme assim, inda rocí com uma canoira num tanganho de mongariça, que p' ali tava, e fiz um golpe aqui na barriga da perna, salvo seja.

Doé-me um coiséco, má' isso nã foi nada. O pior é qu' arrompi as calças do D'mingo e pensí mo qu' ê tinha qu' ôvir da minha Maria:

- E nã tens cudado nenhum... E agora, D'mingo c'm' é que vás missa?... E ê que já nã vejo p'a dar uns pontos nisso... E toma àbaxo e toma àcima...

E ê cá, despôs, falta-m' a pacência e tenho de fazer de conta que tenho munto serviço, qu' inda tenho qu' ir b'scar palha ô sobrado pô Jericó, milho à casa de despêjo p'a dar ô pórco e uma cevada-avêa p´ôs coelhos, qu' assim já nã tenho qu' a ôvir. Qu ê sô amigo dela, nã pensem...

Bom, mecêas sã boas pessoas, mái isto, p'r hoje, já tá bem bom.

Q'ondo lerem isto, nã s' desqueçam de escrever aí, seja o que for, nos c'mentáiros, que vomecêas inda nã escreveram coisíss'ma nenhuma e o Parente da Refóias, assim, fica desmarrido pensando que ninguém l'e liga.

Toca a andar... Digam qu' isto qu' é munto advertido, que gostam munto e más esta e más aquela... e tal e coisa...

Ó atã, digam log' a verdade e pronto.

É qu' ê bem vejo que vocemecêas, q'ondo calha, vêm ver isto. Qu' aquilo ali já resista p'ra cimba dum cento de v'sitas.

De manêras que, Dés l'e dê saúde e até ôtro dia.

3 comentários:

  1. Tenho estado a ler e estou encantada por encontrar certas palavras que só em Monchique ouvi e que por não as ouvir diariamente já me vou esquecendo. Grande blog, continue a escrever que eu vou passando por cá para ir lendo, pois tou a gostar imenso e já dei por mim, sozinha aqui, á gargalhada.

    ResponderEliminar
  2. Eu gostei de lembrar como as pessoas falavam antigamente.
    ja se ouve pouco falar assim
    ou entao pouco se ouve.
    Continua pois esta muito bom parabens...

    ResponderEliminar
  3. Parente, pôs é cá tamém tou dacorde que Marmelete é um pove enteressante e nos últemes anes tem-se desenvolvide um pedaceco.
    É conhece munta gente de lá, prencipalmente os más velhes, pôs qondo era novo mori pa lá páqueles serres, em vairas casecas...Era quás uma em cada ane, o parente deve saber côme era os pobres daquela altura.Más até é quás vergonha dezer que nunca fui à capelinha de Sant'Antóino, tenhe darrejar um becadeque de tempe pa ir dar um passêo lá, assim qué ter jeite vou até lá.
    O qué cá tive munta mágoa foi de ver aquile quondo foi dos encendios. Vim daprepósite de Portmão, passande pla Perêra a assubir aquela serra na minha Zundap qaté urrava e aquilo era tude uma dó d'alma, tude prete e até as pedras tinham arrebentade com o calor do fogue e atã Marmelete parecia uma terra assombrada. Até é melhor nã m'alembrar, que se me corta o coração e fique com os olhes chês de lágremas.!!
    Ainda bem que o tempe nã tem ido munte quente este Verão e choveu alguma coisinha com jêto, a ver se temes sorte e nã ase quemam as nossas terrinhas, senã vai ser outra desafortuna.
    Boa nôte e druma com os anjes, mé amigue
    O Campaniço

    ResponderEliminar

Obrigado por visitar e comentar "O Parente da Refóias"